Perfis da Espanha: Andanças culturais a propósito de um Congresso Internacional – Parte 1 de 4

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Contaram-me em certa ocasião que alguém se aproximou de Ortega y Gasset para lhe pedir algum tipo de explicação conceitual. O filósofo olhou para o interlocutor, sorriu e disse: “O que o senhor precisa é ler menos e viajar mais”. Este conselho se me fez presente no momento em que o nosso avião aterrissava em Madrid, no primeiro dia de Outubro de 2010 com um nutrido grupo de 19 pessoas, rumo a um Congresso Internacional em Málaga. O Congresso era, sem dúvida, o motivo central da viagem. Mas haveria oportunidade de visitar diversos locais e cidades na Espanha, ocasião de mergulhar na cultura e na historia. Uma viagem que, bem aproveitada, ajuda a entender o mundo, o ser humano, porque é sempre um diálogo enriquecedor.

Saindo do desembarque, lá estava o ônibus, que seria nosso companheiro fiel nas andanças espanholas. Situe-me no primeiro banco, fiz-me com o microfone e, sem demoras, comecei a falar. O grupo era numeroso e heterogêneo. Logo percebi que não seria possível que todos estivessem juntos sempre, prestando atenção, escutando as explicações que por ventura eu poderia dar. Mas entendi também que, de alguma maneira, esperavam a minha colaboração. Afinal, o convite para integrar a força tarefa na empreitada acadêmica tinha partido de mim. Assim, decidi que faria comentários no microfone para quem quisesse escutar, e ao longo do percurso e dos muitos passeios que nos aguardavam, conversaria com os que caminhassem do meu lado.  Contaria historias, pois essa é principal função de quem faz de guia. Trata-se de ajudar a ver, de facilitar o diálogo com a cultura que o panorama, completamente novo para a maioria, nos ofereceria.

2- 3 de Outubro: Madrid

Do aeroporto de Barajas, saímos rumo ao Hotel. Microfone ligado, adverti sobre a topografia de Madrid que, em outono, mostra-se com um clima particularmente acolhedor. Uma cidade construída com escala humana, para o homem, não para os veículos, que são muitos. Na verdade foram um amigo arquiteto e o meu irmão biólogo, os que me fizeram notar essas características da capital espanhola. Por isso, é agradável passear pelas amplas calçadas, regulares e bem cuidadas, sob a sombra das numerosas arvores –é a cidade melhor arborizada da Europa, segundo alguns- que perfazem um verdadeiro túnel verde na primavera e no verão; e no outono, com o cair das folhas, deixam filtrar-se o sol, para aquecer o ambiente. E à noite, uma luz âmbar envolve a cidade que continua vivendo até altas horas da madrugada. Os passeios noturnos em Madrid são inesquecíveis, tem um sabor único.

Passamos do lado da Porta de Alcalá e logo mais a Cibeles nos dava as boas vindas. “Eis um cartão postal de Madrid –comentei- e, lembrem, mais do que fazer fotos de paisagens e monumentos –que sempre terão inferior qualidade a qualquer foto oficial- façam fotos de vocês diante desses locais. Esse é um cartão postal que não está à venda”. Mesmo sabendo que o meu conselho não teria um alto impacto, a advertência foi válida: as inúmeras fotos –milhares, certamente- que se fariam nessa viagem, incluiriam algumas com pessoas, que são as que se lembram sempre com carinho.

Situados no hotel, que seria o nosso quartel geral nos próximos dias, dedicamos os dois primeiros a conhecer Madrid. Ou melhor, a passear pelas ruas, observar as gentes, contemplar monumentos. O grupo, como era de se esperar, não tardou em dispersar-se, em reunir-se, em dispersar-se novamente, para encontrar-se sempre no final do dia no hotel. Eu, sempre acompanhado, por estes ou aqueles, procurei não poupar comentários, histórias –muitas delas aprendidas na minha infância- que pudessem ajudar a apreciar a realidade da minha cidade natal. Caminhamos do hotel até Puerta del Sol, fazendo uma parada estratégica para almoçar num dos muitos bares que estão situados no caminho. Foi o primeiro contato do grupo com a culinária espanhola, que nos acompanharia nos próximos dias, representada emblematicamente nas famosas Tapas. “Pode-se pedir um almoço na Espanha, há inúmeras possibilidades. Mas quando o objetivo é passear e conhecer as cidades, a opção certa é tapear. “O que seriam as tapas?”- surge a pergunta obrigatória. Talvez petiscos, talvez quitutes, sei lá. As tapas são únicas, algo muito espanhol e, como mais de um já comentou, não há tapa que seja ruim.

Após cruzar pela Gran Via e chegar a Puerta del Sol, nos defrontamos com a estátua do Urso e do Madronho, símbolo de Madrid, pois é dessa árvore que a cidade empresta o nome. No centro da praça, a estátua de Carlos III, o rei Bourbon responsável pelas melhoras urbanísticas na capital de Espanha, o que lhe valeu o titulo do “melhor prefeito de Madrid”. De lá, não sem antes parar na famosa confeiteira “La Mallorquina” (desde 1894) onde compramos uns doces típicos, nos dirigimos à Plaza Mayor, com parada obrigatória para um café.

O percurso clássico no Madrid de los Austrias –assim chamado porque corresponde à época dos séculos XV- XVII, reinado dos Habsburgos na Espanha- , nos leva da Plaza Mayor, pela Calle Mayor, até o Palácio Real, que nos faz mudar de cenário e dinastia, introduzindo-nos no Madrid dos Bourbons. O Teatro da Opera, de frente ao Palacio,  a Catedral de la Almudena, do lado esquerdo e os Jardins de Sabatini no lado direito, desenham um outro cartão postal da cidade. Como andávamos com o tempo um pouco justo, e queríamos pegar o Metro em Opera, atravessamos a praça onde estão situados os reis godos –não faltou uma primeira aula sobre a história de Espanha, quando Espanha ainda não existia como tal. Leovigildo, Recaredo, e um chamado de atenção sobre D. Pelayo, com quem depois encontraríamos no seu habitat nas montanhas de Covadonga. O nosso dia finalizou numa Jamoneria (cervejaria onde há tapas, e se vendem jamones, outra personagem importantíssima que foi apresentada ao grupo nesta viagem, com grande sucesso).

Ainda em Madrid, o dia seguinte, nos brindou a oportunidade de passear pela cidade, pois o tempo –encoberto, mas agradável- o permitia. Descemos pela Gran Via, até encontrar Alcalá, cruzamos por Cibeles e, na altura da Puerta de Alcalá, entramos no Parque do Retiro. As explicações históricas sobre o parque, construído na época de Felipe IV, privativo dos reis, aberto muito depois à nobreza, e finalmente ao público, também se fizeram necessárias. Paramos para tomar um café na frente do estanque, onde já tínhamos aprendido que em tempos em que o parque era destinado ao retiro dos reis, estes se divertiam simulando batalhas navais no pequeno lago.

O passeio pelo Retiro, com saída na porta da Cuesta de Moyano, nos fez passar diante da estátua do Angel Caído, que chamou a atenção do grupo. Em Atocha –uma lembrança ao atentado de 2004- enveredamos pelo passeio da Castellana de volta para Neptuno. Começou a chover e decidimos pela melhor opção: entrar no Museu do Prado, e gastar um par de horas por lá. Fiz uma advertência: “Não adianta quere ver muitas coisas. Sugiro Velazquez, y Goya, para mergulhar na pintura espanhola”. Na verdade, tivemos também oportunidade de ver algo de Murillo e de El Greco. Quando saímos, a chuva tinha parado, e o cansaço impunha volta ao hotel e um descanso merecido.  Mas, não para todos: houve quem foi assistir ao jogo do Real Madrid que nesse domingo era ás 9 da noite. E quem foi não se arrependeu: uma goleada de 6 x 1 para o Real, coisa que fazia muito tempo não se via no estádio Santiago Bernabeu.

4 de Outubro: El Escorial, Segovia, Ávila

Os dias que permanecemos em Madrid antes de sair para o Congresso Internacional que teria lugar em Málaga tinham decidido conhecer locais situados a pouca distância da capital espanhola.

Assim, o primeiro dia saímos rumo ao Escorial, para visitar o Monasterio e Palácio estabelecidos a pouco mais de 50 km. de Madrid. Era segunda feira e estava fechado, de modo que não pudemos visitá-lo por dentro. Mas, o ambiente majestoso da arquitetura de Juan de Herrera, impunha uma explicação que, conforme nos aproximávamos da cidade, brindei com a ajuda do microfone.

A iniciativa desta construção que é todo um símbolo do Império Espanhol, partiu de Felipe II quando em 1557 derrotou os franceses na batalha de São Quintin, no dia 10 de Agosto. Esse dia, a Igreja celebra a festa de São Lourenço, um mártir romano dos primeiros séculos do cristianismo, que foi queimado numa grelha. Daí a forma de grelha invertida –as quatro torres são os pés da grelha- que apresenta o conjunto arquitetônico, em honra de S. Lourenço, que também dá nome ao Real Sitio de São Lourenço del Escorial. Lá estão enterrados, no Panteão, os principais reis da Espanha, com as rainhas consortes; e, quando o rei foi casado com várias rainhas, a escolha recai sobre aquela que foi mãe de um futuro rei. Reis e mães de reis: eis o critério que permite ser enterrado no Panteão real de El Escorial.

Passeamos pela esplanada, ao tempo que respondia as perguntas sobre essa época do Império espanhol, onde “o sol não se punha nunca”. Como assim? –perguntou alguém. “Repare, quando anoitecia nas Filipinas (que, por sinal, se chamam assim por conta de Felipe II), amanhecia no Peru, pois tudo isso era território espanhol no século XVI”. A famosa biblioteca de El Escorial, onde se guardam obras originais –por exemplo, o livro da Vida de Santa Teresa-  também foi objeto de comentários. E, naturalmente, a sala do Trono que contrasta na sua simplicidade com a riqueza da Basílica. “Fiz um palácio para Deus e uma choupana para mim” –respondia o Imperador Felipe II quando lhe interrogavam sobre esta questão.

Uma pergunta, no meio do passeio, surpreendeu-me. Um estudante se aproxima e me interroga: “Por que queimaram a esse São Lourenço?”. “Como assim? Era um mártir!” – respondi. A perplexidade que o meu interlocutor refletia no olhar me fez perceber que a explicação dada no microfone do ônibus, dava por sabidos conceitos que mereciam um repasso.  E assim o fiz, quando de novo no ônibus, rumo a Segovia, fiz um pequeno resumo dos primeiros três séculos de Cristianismo, as perseguições e os mártires, a paz de Constantino após vencer a batalha da Ponte Mílvia, seguindo o emblema da Cruz: “In hoc signo vinces”.

Em Segovia –como em todas as cidades que visitaríamos depois- os ônibus não podem circular no Centro, de modo que fomos obrigados a descer no estacionamento reservado para esses veículos, e caminhar a pé. Fizemos uma foto oficial na praça, tendo como fundo o Aqueduto romano, símbolo da cidade, construído há mais de 2000 anos. Tem mais de 800 metros de comprimento, quase 200 arcos, e as pedras que o integram encaixam apenas forças geométricas, sem uso de nenhum tipo de cimento. Sempre tirando lições da história, se comprova como as coisas bem feitas superam a barreira do tempo.

Subimos até a ponta lateral do aqueduto e de lá caminhamos para ver a Catedral, de estilo gótico tardio e, posteriormente,  nos dirigimos até o Alcázar. O Alcázar de Segóvia –outro símbolo da cidade- e um castelo-palácio que foi construído no século XII, e reformado múltiplas vezes, até o século XIX. Seu perfil peculiar inspirou Walt Disney para desenhar o Castelo de Disneyworld que todos conhecem: de fato, quando estivemos à frente dele, notamos que para todos era familiar.

Em Segovia Isabel a Católica foi proclamada Rainha de Castela, e também de Segovia saíram importantes apoios na guerra das Comunidades (Comuneros), que enfrentaram as tropas do jovem Imperador Carlos V (de Alemanha), neto da Rainha Isabel, quando veio à Espanha dos países baixos (nasceu em Gante) para ocupar o trono da Espanha. As Comunidades de Castela foram derrotadas, e Carlos assumiu o trono e o título de Carlos I da Espanha: ele seria o pai de Felipe II.

As visitas que fizemos a todas as cidades tiveram sempre a limitação do tempo: poderíamos ver muitas coisas, mas sem tempo de nos deter nos detalhes. Por isso a recomendação que fiz desde o começo: “Esta viagem oferece a oportunidade de ter uma visão geral de muitas cidades da Espanha, mas não haverá tempo de parar, entrar para visitar cada monumento ou museu. Temos de fazer uma opção, e a mais sensata parece a de obter uma perspectiva global das cidades, e dos destaques de cada uma”.

Mas os passeios pelas cidades de Castela nos ofereceram a oportunidade de entender e reconhecer os principais estilos arquitetônicos que se replicam ao longo das ruas. Muitos foram os comentários que, fruto das lembranças que tinha das classes de história da arte –tive excelentes professores na matéria- fui tecendo conforme caminhávamos de um lado para outro. O estilo românico, que surge num canto de uma praça, ou dobrando uma esquina. Sólido, pesado, escuro, quase sem janelas, como reflexo de uma espiritualidade que muito tinha de temor, e não se atrevia a levantar o olhar aos céus. As virgens românicas, sentadas, com a criança no colo, amparando-a, mas de olhar distante. O majestoso gótico –inicial, tardio, ou isabelino- com suas altas torres, agulhas, arcobotantes que apóiam a audácia da altura que se eleva, em petição confiada. Luz, muita luz entrando pelos seus vitrais, e as virgens deixam de estar sentadas, se incorporam de pé, e o menino desloca-se lateralmente, entre os braços, enquanto os olhos de Nossa Senhora estabelecem o diálogo com o interlocutor que acode à sua intercessão. Os monumentos mudéjares, ou mouriscos, dos árabes que morando em território cristão mantinham a sua própria cultura que se refletia na arquitetura. O estilo mozárabe, de cristãos que viviam em território dominado pelos árabes, e também plasmavam a cultura em monumentos próprios.

Ainda nos aguardava outra visita geral antes de regressar a Madrid. Paramos num bar para uma rápida refeição –sempre com base em tapas e sanduíches- e partimos para Ávila.

Ávila surge com o perfil inconfundível conforme nos aproximamos dela. As muralhas se recortam no horizonte, rodeiam toda a cidade antiga ao longo de 2500 metros, com 85 torres e mais de 2000 alméias. São talvez as muralhas medievais melhor conservadas do mundo.

O nosso passeio ao redor das muralhas teve uma parada obrigatória junto à estátua de Santa Teresa, natural da cidade. Seguindo a tradição as mulheres do grupo fizeram uma foto junto da estátua, prestando assim homenagem –e pedindo ajuda- a esta mulher do século XVI que teve voz de comando, personalidade, e liderança num universo predominantemente masculino.

Antes de sair, houve quem seguiu a recomendação de comprar as Yemas de Santa Teresa, uns doces de ovos típicos da cidade. No final da tarde, voltamos a Madrid, após um percurso de 200 km e com uma enorme quantidade bagagem cultural que, certamente, terá o seu desdobramento com o passar dos anos. A cultura –como os monumentos que contemplamos, como as catedrais- não se improvisa a modo de fast-food. É preciso o decantar do tempo, o cultivo do espírito, a familiaridade com a história.

5 de Outubro: Toledo

Dedicamos o seguinte dia a Toledo, outro ponto obrigatório para quem passa alguns dias em Madrid. Situado ao sul de Madrid, a 50 km, Toledo é também outro monumento patrimônio da humanidade. Capital imperial nos tempos de Carlos I e de Felipe II (que trasladou a capital a Madrid, a finais do século XVI), foi também capital dos Visigodos, a partir do século V.

Toledo é o símbolo do convívio de culturas e religiões: judeus, muçulmanos e cristãos. E desse convívio resulta o encanto especial de Toledo. Suas ruas estreitas – na juderia, o bairro judeu-, seus inúmeros monumentos cristãos –como a Catedral, de estilo gótico, sede do Primaz da Espanha- que possui um museu de arte sacra fabuloso. Toledo que, no dizer de Marañon, tinha na época de El Greco quase 100 monumentos religiosos entre conventos, igrejas, catedrais, mosteiros e basílicas. A cidade, na época, no final do século XVI não tinha mais de 40 mil almas. As ruas de Toledo respiram um ar medieval, onde se percebe o aroma dos séculos. E também um ambiente de lenda, de romance, de amores –sadios e proibidos- e o ruído dos próprios passos, quando se caminha sozinho, parece mesclar-se com o tilintar das espadas de algum duelo de cavaleiros que estavam tirando a limpo a questão da honra de cada um.

Mas não teríamos tempo de contemplar os detalhes e nos focamos numa visita geral à cidade. A praça central, Zocodover, à qual chegamos caminhando porque o ônibus não pode circular na cidade. Do lado da Praça o Alcázar de Toledo, que permanece fechado, pois deve se converter num museu do exército espanhol.

Relatei o episódio da resistência do Alcázar durante a guerra civil espanhola. As tropas nacionais foram cercadas pelas republicanas que tinham como refém ao filho do general que comandava as tropas do Alcázar, e ameaçaram com matá-lo caso não entregasse a fortaleza. O general Moscardó manteve-se firme e contam que até jogou a arma dele do alto do Alcázar dizendo que não o entregaria nunca e que se não havia armas para executar o próprio filho ali estava a dele. Fiz notar que, apesar do desprestígio das figuras que lutaram do lado de Franco na guerra civil na Espanha de hoje, governada pelos socialistas, o nome do General Moscardó se mantém na rua lateral do Alcázar, como símbolo de uma coragem impar.

Toledo é também a cidade de El Greco, pintor do século XVI que viveu e morreu lá. Muitas das suas obras se encontram em Toledo, mas como o tempo urgia nos decidimos por uma das imprescindíveis: “O enterro do Conde de Orgaz”, na Igreja de São Tomé. Permanecemos contemplando o quadro –que se mantém perfeitamente desde o século XVI- com os seus dois planos – o terreno e o celestial -, as figuras alongadas representativas do estilo místico de El Greco, o convívio de cavalheiros com os santos, os mortais e os que já estão na glória, e o anjo carregando a alma do senhor de Orgaz, como se de uma criança se tratasse-, ajudando no parto para o mundo celestial.

Uma surpresa muito especial nos esperava em Toledo. Nesse mesmo dia, no final da tarde, se inauguraria a exposição dedicada ao cinqüentenário da morte de Gregorio Marañón, médico, humanista, escritor, um símbolo da cultura espanhola. A exposição vinha sendo realizada em várias cidades, e agora era a vez de Toledo, cidade muito querida de Marañón. Lá tinha o famoso médico uma casa de campo –um cigarral, assim se chamam em Toledo essas casas campestres- e lá escreveu a maioria dos seus livros. Entre outros, “El Greco y Toledo”, onde Marañon realiza uma análise profunda do pintor e afirma que foi Toledo quem ajudou a desabrochar a pintura mística de El Greco, e lhe possibilitou o crescimento artístico.

A exposição seria inaugurada à noite, mas o diretor –conhecido nosso- teve o fantástico detalhe de abri-la para nós no final da manhã. E ali, em 45 minutos, Antonio López Veja, Diretor da Exposição e uma das maiores autoridades na vida e obra de Gregorio Marañón, nos brindou uma visita guiada, com explicações, comentários e histórias que resultou num evento inesquecível, além de ser um verdadeiro banho de cultura. Em todos os que assistimos ficou gravado o seu comentário inicial: Marañón era um liberal, um homem que convivia e se entendia com todos, mesmo com os que pensavam de modo diferente; e colocou essa divisa como norma da sua vida e os seus talentos e prestígio enorme ao serviço da sociedade. E aprendeu o espírito liberal na sua casa, onde contemplava como os intelectuais que de manhã publicavam na imprensa idéias contrárias, eram capazes de tomar café com o seu pai, de tarde, em animada tertúlia (Leia os comentários sobre Marañon feitos por um dos estudantes que esteve na exposição). Foi um verdadeiro privilégio, com fecho de ouro: Antonio nos entregou o catálogo da exposição, com uma dedicatória carinhosa para a SOBRAMFA. O Catálogo incluía um DVD com muitos dos comentários que já nos tinha brindado, e tivemos oportunidade de vê-lo no ônibus no dia seguinte, rumo a Andaluzia.

Nesse dia, saindo da exposição, almoçamos todos juntos. Uma conversa animadíssima, de um par de horas, para preparar o congresso que começaria o dia seguinte: os integrantes foram expondo as expectativas, as dúvidas, os sonhos que trouxeram na viagem. As tapas circulavam na mesa redonda que tivemos de improvisar – houve certa confusão no restaurante, pois éramos 19- e as conversas fluíram com naturalidade….mas em inglês!! O Dr. Josh Freeman e a sua esposa Patricia Kelly, que integraram nosso grupo nesses dias, foram os moderadores e todos tiveram que ajeitar-se para expor em inglês as suas idéias. Foi outro momento inesquecível, no ambiente Toledano, tão propício para conversas humanísticas, e para os sonhos que envolvem como nuvem a cidade do rio Tejo.

Antes de regressar a Madrid, houve a dispersão típica em busca de lembranças. As recomendações já tinham sido dadas: Marzipão (produto de amêndoas, típico de Toledo) e as bijuterias “damasquinadas” (em preto e ouro), outro símbolo toledano. Naturalmente houve quem pensou em comprar alguma espada de souvenir, mas ninguém se decidiu pensando que não seria simples voltar em avião com uma espada de Toledo na mala.

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