VEM DANÇAR COMIGO
VEM DANÇAR COMIGO.(Strictly Ballroom) Diretor: Baz Luhrmann. Paul Mercurio, Tara Morice. Austrália 91991. 95 min.

O cinema australiano nos surpreende com esta fita que, sem grandes pretensões, torna-se um passatempo agradável, de excelente bom gosto e originalidade.
O argumento é simples: um concurso de dança com ritmo “latino”. O objetivo: encontrar a parceira ideal para o grande campeão, garoto rebelde que inventa “passos novos” nas danças de salão, provocando o escândalo dos jurados tradicionais.
Uma história de romantismo, que muito bem poderia ser a versão musical de Cinderela. Tudo embrulhado em continuas danças: boleros e rumbas, a clássica valsa, tangos e “passo dobles” formam o pano de fundo do filme que se assiste com agrado. Se a força dos musicais consiste em exprimir com canções o que com palavras resultaria pobre, em “Vem Dançar comigo” a magia do cinema vem servida em forma de dança.

Um filme original que nos contagia e anima. Contagia para dançar -empreitada que tal como é apresentada parece fácil e cativante- e nos anima para viver a vida sem medo. O recado da protagonista é um canto de audácia e alegria de viver: “Viver com medo e como viver pela metade” – diz a nossa Cinderela. Verdade contundente, apresentada de modo simpático mas nem por isso carente de força.

É o poder da simplicidade, que atinge o nosso ânimo com impacto equivalente à tragédia. Vivemos tempos de insensibilidade, com o espírito enferrujado e paquidérmico, anestesiado para os tons médios, para a descolorida rotina diária. Reagimos aos estímulos de registro grave, ao drama, ao golpe contundente da violência. E, por contraste, nos toca -talvez fazendo cócegas- a ingenuidade, a candura. Extremos dissonantes que abraçam o mutismo apático das escalas médias das emoções, dos estímulos corriqueiros. Quem sabe por isso, proliferam tanto hoje em dia as personalidades desequilibradas, estridentes, de afetividade desafinada.

“Não sei onde fracassei como mãe” diz a personagem que vê esfarelar-se o sonho de ter um filho campeão… de dança. Situações cômicas, caricaturas e estereótipos que nos fazem sorrir, mas beliscam a sensibilidade adormecida. Uma fábula da vida onde o mundo todo se resume a passos de dança. E na parábola dançante desfilam, em fácil evolução, o medo do compromisso, o egoísmo larvado, a pusilanimidade de quem nada arrisca. Servidos, todos eles, com muita coreografia, politicamente corretos. Por isso, quando se vive sem medo, com alegria plena, livre de medos e receios a dança, cheia de arte, surge como elemento salvador. Com um ritmo que é marcado pelo coração, no peito aberto para os desafios, em diapasão vital.
“Vem dançar comigo” é um filme para ver em família, que agradará a todos e mexerá com os ânimos de jovens e velhos, empurrando-os para a pista de baile, e para e vida, que deve ser vivida “por inteiro”.