TUDO PELA VIDA

Pablo González Blasco Filmes Leave a Comment

(Passion Fish) Diretor: John Sayles. Mary McDonnell, Alfre Woodard. Angela Bassett. USA 1992. 130 min.

May-Alice é uma atriz de seriados de TV que, após um acidente, fica paraplégica. Chantelle é a enfermeira contratada para tomar conta de inválida. O filme decola neste contexto para manter-se 2 horas num “mano-a-mano” entre as duas mulheres. Revoltas e limitações, dificuldades e tragédias, miséria e magnanimidade, enfim, todo o espectro dos sentimentos humanos se sucedem num filme muito bem conduzido.

            “Se tiver problemas pessoais, neuroses, traumas, por favor não me conte, vá embora” -diz May-Alice. As personagens -e o espectador no vácuo delas- irão descobrindo ao longo do filme um velho ensinamento: o melhor modo de superar os próprios conflitos é cuidar dos problemas alheios. O homem problemático é, no fundo, um ser egocêntrico, que vive para seus dilemas e, por isso, acaba consumindo a vida sem vivê-la.

            O nascimento sereno de uma amizade, tímida e hesitante no início, amadurece sem sentimentalismos ao tempo em que a confiança preside a relação entre as duas mulheres. Aprende-se a abrir o coração, a pedir ajuda sem orgulho, a brindá-la sem esperar que a peçam, a mostrar os defeitos sem sentir-se diminuído.  Não é pobre o ensinamento: deixar-se querer que é a humildade da verdade, dos fatos, em palavras de Teresa de Ávila, mística, santa, tremendamente feminina. Sem tragédias, sem arestas nem espinhos: “Você terá de fazer por mim o que eu não posso fazer, que hoje é praticamente tudo.”

            Tornar-se apto para ouvir e perdoar; saber compreender. Arte difícil esta da compreensão. Capacidade que nasce -comenta Marañón- de superar as próprias paixões, do esforço por ser melhores que é onde se adquire a tolerância para julgá-las nos outros com benevolência. Um julgamento que não será nunca de cima para baixo, mas de quem está no mesmo barco. E por isso -continua o médico humanista- somente conhece os caminhos retos quem já palmilhou os tortos; daí que a melhor intenção não é talvez a do homem impoluto mas a de aquele que alberga na alma as cicatrizes de muitas retificações.

            Tudo pela vida é mais um filme em “linguagem feminino”. Uma ocasião de sublinhar o valor da amizade, que se destaca por cima da miséria embutida na própria condição humana, como força salvadora e reconfortante. As paisagens da Louisiana, com uma fotografia bem cuidada e um trilha sonora escolhida com acerto são um belo papel de presente, para embrulhar este filme que agradará pelo seu denso conteúdo de humanidade. Afinal, os homens são assim mesmo, com suas paixões e seus defeitos: é preciso contar com isso para, apostando neles com uma amizade generosa, ajudá-los -e ajudar-nos a nós mesmos- na tarefa se ser melhores a cada dia.

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