Balduin Schwarz: “Del Agradecimiento”.
Balduin Schwarz: “Del Agradecimiento”. Ed. Encuentro . Madrid. 2004, 47 págs.
Tropecei -literalmente- com este pequeno opúsculo filosófico, enquanto colocava ordem numa das estantes de livros. Nem sei como foi parar lá. Encontrei algumas marcas na margem, que não reconheci como minhas. Talvez algum amigo? Já começa a surtir efeito o título do livro, pelo agradecimento que, no meu caso, brilhou pela sua ausência. Quem será que me deu isto e eu nem me lembro?
Confesso que o título da obra, um volume mínimo de 50 páginas, piscou para mim. A gratidão é virtude ausente, esquecida. Quando alguma vez ocorreu-me comentar sobre ela, houve quem me fez notar que o ensinamento é antigo: bíblico, para ser exato, evangélico. Daqueles dez leprosos que foram curados por Jesús, somente um voltou para agradecer. “Se a taxa de retorno na Bíblia é de 10% o que você espera dos mortais comuns?”
O autor, discípulo de Von Hildebrand e que transitou pela fenomenologia, centra o tema do com precisão: “O fenômeno agradecimento somente se refere a pessoas, a outras pessoas. A relação entre pessoas nas quais surge o agradecimento é entender que aquela pessoa nos fez um bem gratuitamente, mostrou sua benevolência. Aliás, é preciso entender que não há outros motivos para a gratidão a não ser a própria benevolência de quem a teve conosco”. E faz uma importante advertência para não confundir agradecimento com simples manifestações de entusiasmo: “Podemos nos contentar com as formas convencionais de agradecer sem estar, de fato, agradecidos (..) Não se deve confundir a alegria que sentimos (porque recuperamos algo, porque alguém nos ajudou) com o agradecimento. Tem de ir além da alegria. E ser manifesto”.
A baixa taxa de retorno que este investimento traz, explica-se porque mexe com as profundezas humanas, com o sentimento de dependência, que nunca gostamos de admitir. Para ser agradecido é preciso humildade, aquela virtude que é a clareza, a verdade (em palavras de Teresa de Ávila) e sem a qual nenhuma outra virtude se sustenta, como advertia Cervantes nas suas Novelas Exemplares.
Anota Schwarz: “Na vivência do agradecimento se faz consciente a dependência humana. Podemos afirma-la com humildade autêntica e interiormente aceitada, ou sentir-nos humilhados por ela. Por isso alguns, para evitar a humilhação, buscam até razões inconscientes para não estar agradecidos (…) São estes os mesmos que pensam que não há mais do que comportamento egoísta entre os humanos; e reúnem experiências negativas para demonstrá-lo, para vacinar-se da ingenuidade, negando uma benevolência autêntica entre os homens. Têm particular complacência em acumular material negativo. Deste modo conseguirão secar suas fontes de agradecimento”.
O agradecimento promove a solidariedade, humaniza as relações. É um continuo lembre-te de que não sou o centro do mundo, que os outros de fato me importam, e que eu também preciso deles. “Agradecer encontra-se na base da solidariedade humana. Levanto a vista e reconheço o outro como pessoa, como alguém que está além de um meio para eu conseguir meus fins (…) Num mundo social que está sob a opressão da própria organização, os atos que levam ao agradecimento são como um antídoto contra a desumanização”.
Agradecer é também elegância, cuidado do detalhe, criar um ambiente de concórdia -coração com coração, dizia Ortega. Aponta o autor: “O agradecimento combate a tendência geral dos homens de dar as coisas por supostas (…) Quem não agradece -e pior, o ingrato- é parente do irresponsável na sua atitude perante a vida. Está atento somente a ele mesmo, falto de reverencia, não conhece nem reconhece aquilo que está escondido nas coisas , nos homens, nas situações, como seu próprio valor”.
Quem é agradecido tem um caminho mais fácil para chegar a Deus, a quem nos une uma relação de completo agradecimento. O autor lembra o comentário de Chesterton sobre Rosetti, um poeta inglês que professava o ateísmo: “Para um ateu o pior momento é aquele no qual se encontra agradecido e não tem a quem agradecer”. Isto porque agradecer é reconhecimento para com o outro, mas também é o que nos permite a plenitude da nossa existência. Lê-se quase no final do opúsculo: “O agradecimento é uma resposta que se segue ao receber. Mas, de algum modo, também o precede, porque somente consigo me apropriar daquilo que recebo externamente com agradecimento”.
A gratidão é como o paladar para saborear a própria vida, degustá-la a cada momento, e convidar os outros para essa celebração: algo que está ao alcance de todos, mas que poucos sabem aproveitar. Somente por esta advertência vale a pena a leitura deste instigante caderno.
Comments 5
Para agradecer precisamos ter humildade para reconhecer que recebemos ajuda no momento em que necessitamos e estivemos vulneráveis.
Para ajudar temos que ser amadurecidos a ponto de não esperarmos reconhecimento e retorno.
Gostei demais deste texto.
Gosto da palavra “Gratidão”, fico receoso, que de tanto uso, fique esvaziada.
O mesmo ocorre com a palavra “Desculpe”.
O texto me convida a usar generosamente a palavra, sintonizada com o Coração.
Muito Obrigado Pablo!
Sempre que leio suas resenhas e artigos ilumino meu olhar ao Humano.
Ótima reflequiçao com sabedoria humanitária obrigado Dr Pablo G Blasco que Deus te a Bençoi e sua família
“O agradecimento promove a solidariedade, humaniza as relações.”
Belíssima análise do livro, Prezado Prof. Dr. Pablo Gonzáles.
Confesso que adorei o “tropecei – literalmente ”, do qual o fez encontrar e explorar tal obra.
A resenha crítica, se assim posso chamar, deixa viva a certeza de que além de muitos outros aspectos. “Agradecer”é humanizador.
Só cabe um palavra: obrigado!