J.D. Salinger: “Franny & Zooey”. Editora do Autor. Rio de Janeiro. 1970
Salinger é um autor “Cult”, o que significa que todos se sentem no direito de opinar e vasculhar o significado dos seus escritos. Depois da sua recente morte, o tônus “Cult” aumentou. Acerca deste livro já se escreveu muito. Há quem diga que é uma discussão de caráter religioso, outros uma busca de sentido, outros um ensaio psicológico que mais se assemelha a um teatro do que a um romance. De qualquer forma, não é o caso de recolher opiniões alheias, pois cada um pode facilmente encontrá-las postadas aqui e acolá na Internet. E todos têm direito –apelamos para o Cult- de emitir a sua. A minha não é uma opinião, mas sim uma sensação que tive enquanto lia o livro. Os modos variados do carinho que é possível ter numa família. Para a nossa sensibilidade latina, o aparente pouco respeito com que Zooey trata à mãe e a indiferença com relação à irmã Franny, mergulhada numa neurastenia existencial, são chocantes. Mas a mãe e a irmã não se assustam – como o leitor desavisado-, encaram com naturalidade as grosserias de Zooey, e tiram partido frutuoso dessa relação. Existe carinho, amor verdadeiro. Mesmo que as formas não ajudem. E a sensação me fez pensar que as formas doces –tantas vezes sem conteúdo- de nada servem, quando se trata de ajudar. Sim, é possível chorar com quem chora, e até oferecer um lenço; mas quem sofre tem o direito de esperar que também se lhe facilite saídas honrosas, uma luz no fundo do túnel, esperança sólida, sentido da vida. Uma passagem pelos velórios –que todos, antes ou depois acabamos freqüentando- confirma esta idéia. Sobram condolências e faltam esperança e sentido diante do sofrimento. Falta também criatividade na hora de ajudar. E fortaleza. Lembrei-me do amor de Chaplin por Teresa, em Luzes da Ribalta, que chega até a bofetada que facilita a entrada no palco da dançarina em estado de choque. São muitas sensações –dos velórios até Chaplin- mas é o que dá ler autores Cult. Em qualquer caso, um belo exercício mental de reflexão, sem espaço para a perda de tempo.