SOCIEDADE DOS POETAS MORTOS

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(Dead Poets Society). Diretor: Peter Weir. Robin Williams, Robert Sean Leonard, Ethan Hawke, Josh Charles, Gale Hansen. 1989. 128 min.

Alguns anos atrás participei de um debate numa livraria em Madrid, onde falamos de educação e cinema, e juntamos experiências dos que, de um modo ou outro, utilizamos a sétima arte como proposta pedagógicas. Lá estava um velho amigo, colega de colégio, com quem não encontrava há mais de 20 anos. Hoje é Diretor e Produtor de Cinema e, confesso, senti-me lisonjeado por prestigiar o nosso debate. Lembro que citou “Sociedade dos Poetas Mortos”, como um filme educacional, e ao mesmo tempo difícil. “Se pensamos bem, é um filme onde todos têm razão”. O comentário gravou-se em mim, de modo definitivo, pois sempre lembro dele com ocasião do filme em questão, e em muitos outros momentos. Afirmar que todos têm razão significa que é preciso esforçar-se por entender os motivos dos demais, por sintonizar afetivamente com os seus sentimentos, enfim, por compreender as pessoas em toda sua surpreendente variedade.

            Sociedade dos Poetas Mortos é um filme emblemático, revolucionário, inovador. A construção de novos paradigmas na educação, ensinando os alunos a pensarem por si próprios, é o núcleo do filme e tem dado pano para manga, e substância para inúmeras discussões no âmbito acadêmico. Rasgar o prefácio do manual de Poesia e Literatura Inglesa, que recomenda “medir os poemas como se fossem canos de 3 polegadas”; subir na mesa para contemplar o mundo com novas perspectivas, promover os dons de cada estudante  é um horizonte sedutor, ao qual o professor Keating introduz os alunos, e que de fato cativa qualquer jovem. O sistema, a tradição de uma escola secular, opõe-se aos métodos do mestre revolucionário e lhe recomendam, sem efeito, sensatez. As famílias também tomam partido e, sem querer ouvir explicações nem motivos, obrigam os filhos a seguir o curso que eles, pais, já traçaram de antemão. A tragédia se desencadeia no final e, o revolucionário é obrigado a abandonar seus métodos e a escola, não sem receber a homenagem, emocionante, dos alunos que, subindo em cima da mesa, reconhecem o valor de ter aprendido a pensarem por si próprios. Captain, my captain. Um por um, sobem nas carteiras, e batem continência ao líder que é desterrado como elemento perigoso.

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MADAME SOUSATZKA

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(Madame Sousatzka) Diretor: John Schlesinger. Shirley MacLaine, Peggy
Ashcroft, Shabana Azmi. Inglaterra, 1988. 120 min.

Disciplina é algo pouco na moda nos dias que correm. A educação metódica e a exigência dos educadores com os adolescentes -aqui entram também os pais- , nunca foi motivo de elogio por parte destes últimos. Quem não se queixa do professor exigente, do pai quadrado, da mãe possessiva; enfim, daqueles que exercem suas funções a sério?  A queixa e a rebeldia não são novidade. O problema existe desde que o homem se tornou animal social, há muitos séculos. 

Sendo tarefa destinada ao fracasso, a de tentar sensibilizar a parte afetada – o filho, o aluno, o “educando”- para o problema, pois faz parte do processo normal de amadurecimento, não é inútil deter-se em algo que, aparentemente, vai caindo no esquecimento. E isto é: lembrar aos que educam que os protestos e rebeldias são episódicos. Que sim vale a pena gastar-se no trabalho de educar os filhos e alunos; empenhar-se a fundo, em consciência, dedicando tempo, suportando com paciência as queixas do beneficiário, que sempre -lei de vida- continuarão existindo. 

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DOCES ECOS DO PASSADO

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DOCES ECOS DO PASSADO. (Les portes tournante) Diretor: Francis Mankiewicz .Monique Spaziani, Gabriel Arcand. Canadá. l988. 104 min.

Existem filmes excelentes que correm por fora, alheios ao barulho da propaganda e da mídia. Pequenas joias, encalhadas nas prateleiras do esquecimento, até que algum curioso consegue descobri-las. Doces ecos do passado é um destes filmes, um filme bonito, redondo, onde se misturam com proporção, a imagem e a poesia, engastadas na música, que é a desculpa para todo o filme.

            Celeste é a moça do interior, primogênita duma numerosa família de camponeses e músicos, onde “os instrumentos passavam das mãos de um irmão às do outro, como fazíamos com as roupas quando ficavam pequenas”. Os homens do cinema, cinema mudo -estamos na década dos 20- contratam Celeste para “sonorizar” os filmes: improvisar a trilha musical do filme, com um piano situado do lado da tela, enquanto o filme é projetado para o público. Um argumento original, com sabor clássico, sustenta a trama do filme, que transcorre num “mano a mano” entre o presente dos anos 80 e o passado dos 20.

            O talento musical da pianista, o amor ao cinema, maravilhosa desculpa para sonhar; a força da imagem e do gesto, o poder da música, as generosidades e mesquinharias do coração humano: elementos estes que o diretor usa para esboçar com acerto e delicadeza os traços da alma feminina da protagonista.

             O resultado é um filme encantador, uma pequena obra prima que se assiste com agrado, sem cansar. Certamente fará as delícias do cinéfilo, pelo que supõe de tributo à sétima arte. Mas para todos, também para o grande público, é um filme que atinge, pela carga humana -os problemas do coração que a todos dizem respeito- e pela harmonia do conjunto. Não é um filme de arte, se por arte se entende o cinema hermético de muitas produções europeias. É, sim, um filme feito com arte, carinho e nostalgias, que deixa um bom sabor de boca sem que consigamos identificar exatamente qual a origem do ingrediente que nos conquistou.

As cores pastel, usadas com acerto; quem sabe os gestos apenas esboçados nas despedidas de Celeste, ou talvez as notas de “O cantor de Jazz” que fazem sangrar lágrimas da alma da pianista. Ou o ressurgir da mesma nos compassos de “Não matem a pianista”, tema musical de fundo. Afinal assim é a arte: agradável e única, com a fragilidade de um sonho, que nos escapa quando queremos agarrá-lo. Antoine, o menino, que é como o mestre de cerimônias do filme, ressume bem esta sensação: somos sempre pequenos para as coisas importantes. A arte, o cinema que é arte, nos envolve sempre e, como a música de Celeste,  “nos embala e cuida da nossa alma ferida”.


O MESTRE DE MÚSICA

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(Le mâitre de musique) Diretor: Gerar Corbiau. José Van Dam, Anne Roussel, Philippe Volter. Bélgica, 1988. 98 min.

A estética e o bom gosto é algo cada vez mais ausente nos filmes de hoje. Por isso, esta produção, dirigida pelo belga Gerard Corbiau merece destaque especial. O argumento é original e simples. Um prestigioso cantor de ópera – Joachim Dallayrac-, magnificamente interpretado pelo barítono belga José Van Dam, retira-se dos palcos por motivos de saúde. Daí para frente sua vida será dedicada à preparação de dois alunos: uma jovem soprano e um ladrão, que resgata no meio de um furto, e parece ser um tenor com potencial. Avançado o filme, intervém o convite-desafio do príncipe Scotti, mecenas italiano, para um concurso de canto lírico. A rivalidade de anos, que encerra velhas mágoas entre Joachim e Scotti, será agora protagonizada pelo enfrentamento dos alunos de ambos.

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TUCKER:  O HOMEM E SEU SONHO

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TUCKER:  O HOMEM E SEU SONHO (Tucker) Diretor: Francis F. Coppola. Jeff Bridges, Joan Allen, Martin Landau, Frederic Forrest. U.S.A. l988. ll0 min.

Vivemos uma época de inconstâncias, refratária a ideais que arrastem o homem para cima, levantando-o da mediocridade. É o acomodamento, o culto ao fácil, ao prazenteiro. Falta forma física no idealismo raquítico, e o homem se apresenta com uma vontade obesa, sem agilidade para aceitar novos desafios. As ideias atraem, mas falta fôlego. Enamoramo-nos delas, das grandes ideias, sensualmente -no dizer de Unamuno-  sendo incapazes de casar com elas e formar família. Usamos as ideias como amantes, como companheiras de uma noite.

Talvez por tudo isto, Tucker é um filme a destacar. Uma avalanche de otimismo e liderança, a apologia do homem idealista. Essa decadência vital que padecemos não procede de doenças no corpo ou na alma -comenta Ortega- mas sim de uma péssima higiene de ideais. Por isso -palavras do filósofo- o homem seleto não é aquele que simplesmente acredita ser melhor do que os demais, mas o que se exige mais, mesmo que não consiga cumprir as exigências superiores. É esta a divisão mais radical que podemos fazer na humanidade: a das pessoas que se exigem muito e acumulam sobre si dificuldades e deveres, e aquelas que nada se exigem, sendo para elas o viver em cada instante ser o que já são, sem esforço de perfeição sobre si mesmas, boiando sem rumo pela vida…

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O Dom da Fúria: Construindo a harmonia familiar

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(The Great Santini) Diretor: Lewis John Carlino. Robert Duvall, Blythe Dayner, Michael Olkeefe,
Stan Shaw. 116 min. USA 1979.

Um guerreiro sem guerra, é a frase que pode ler-se embaixo do título deste filme. Um fuzileiro naval, excelente piloto de caça, coronel de disciplina rigorosa, que precisa da guerra como do ar para respirar. Como é sua vida em tempo de paz? Como a vida de qualquer um: cheia de trivialidades, rodeado da família,  da qual faz uma extensão do quartel, governando o lar com espírito militar. Um filme aparentemente sem pretensões e que por não tratar de nada importante, toca com acerto os temas de maior transcendência na vida de um homem: a educação, a família, o amor.

            O recado do filme é claro e de importância singular. Em toda a família existem desavenças, atritos, brigas; até algum que outro grito e, por vezes, chega-se às vias de fato, com a consequente humilhação de quem ultrapassou os limites, deixando-se levar por reações temperamentais. Mas por cima disso a unidade familiar, o amor, a fidelidade persiste intocável, como ponto de referência certo. Uma família sem problemas é algo irreal; lá onde os seres humanos convivem existem diferenças, tensões  geradas pelas limitações de cada um, pela variedade dos pontos de vista. Mas gritos e brigas não passam de episódios corriqueiros, coisas de ordinária administração quando, no fundo, permanece intacto o amor, a fidelidade, a consciência de um ideal realizado em família. Um amor que se manifesta nas cartas de uma mãe que parece uma namorada, no presente do pai guardado por 18 anos, nos detalhes diários, nas pequenas coisas que são o tempero do carinho familiar.

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ADEUS MR. CHIPS

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ADEUS MR. CHIPS. (Goodbye Mr. Chips) Diretor:  Hebert Ross. Peter O’Toole, Petula Clark, Michael Redgrave. Inglaterra 1969. 151 min

Tive a oportunidade de rever “Adeus Mr. Chips”. E o fiz com o mesmo entusiasmo que na primeira vez, quando tinha l3 anos. É um filme cativante, apesar do seu argumento simples. Talvez por isso, pela simplicidade, impõe-se e convence.

O homem é tão complicado -nos fazemos de tal modo complicados- que quando a franqueza de um temperamento transparente que despeja simplicidade nos encanta, sentimo-nos inquietos, sem saber por que, ficamos inculcados, desconfiamos de nós mesmos: serei eu? Algo assim como tentar explicar a sensação de bem estar num bucólico entardecer de primavera ou o agradável do perfume de uma flor.

Certamente, o homem deste começo de milênio, que funciona a golpe de solicitações sobre os seus instintos, e mergulha num ativismo sem rumo, surpreende-se com as coisas simples, como se fossem elementos de outro planeta. Enquanto houver surpresa ainda não está tudo perdido; seria motivo de desespero se perante o encanto que a simplicidade desperta em nós reagíssemos  apenas com indiferença.

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SE O MEU APARTAMENTO FALASSE

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(The apartment) Diretor: Billy Wilder. Jack Lemmon, Shirley McLaine, Fred MacMurray. USA 1960. 125 min

Na vida não existem os caracteres puros, esses que se descrevem nos livros de Psicologia. Menos ainda as pessoas se dividem em boas e más, como dois grupos estatísticos, incomunicáveis. O cinema de bandidos e mocinhos pode ser bom cinema, mas não é vida; por isso nos identificamos pouco com ele embora apreciemos seu valor. E mesmo nos filmes, onde o bem e o mal se enfrentam, se encarnando em personagens que parecem puros -definitivamente bons ou perdidamente maus- a questão não é tão simples. Se este cinema de oposição de forças morais é cinema de qualidade o espectador será cativado pelos valores que as personagens -fictícias- exaltam. As personagens passam, os valores ficam, e isto é o que atrai o público.

            “Se o meu apartamento falasse” é um exemplo de filme onde os valores encontram-se dissolvidos na realidade que é, de per si, complexa e inclassificável. E o filme atrai porque as personagens são reais; isto é, não são simplesmente bons ou maus. São de carne e osso, com fraquezas, com paixões, com acertos e erros. Shirley McLaine e Jack Lemmon, num ponto alto de atuação da dupla -provavelmente a melhor de todas suas parcerias- tornam-se figuras familiares, sugestivas. É fácil identificar-se com quem não disfarça seus defeitos, e faz o possível por superá-los num esforço sereno e sempre progressivo. É a força da sinceridade, do ser simples, da transparência, como se diz hoje.

            Não é fácil mudar. Quem já tentou -e certamente tenta ainda- tem experiência do tamanho da empreitada. E a dificuldade envolvida com os esforços dos protagonistas, gera situações atrapalhadas que, temperadas com a ironia de Billy Wilder -sempre genial- nos oferece estes momentos deliciosos.

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MARTY

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(Marty) Diretor: Delbert Mann. Ernest Borgnine, Betsy Blair. USA 1955. 91 min

Pode-se esperar poesia quando se tem como matéria prima algo vulgar? Um açougueiro, gordo, com pouco atrativo físico é tudo o que contamos para iniciar nosso poema. Fosse pouco, Marty -esse é o nome do nosso açougueiro- é um sujeito tímido, convencido de que nunca deixará de ser o solteirão sem remédio. “Já fiz várias tentativas -diz à mãe num diálogo dramático onde verte todos os seus complexos e limitações- e só arrumei dor de cabeça. Quando se convencerá de que tem na família um filho gordo e feio, um solteirão sem jeito?”. Marty é mesmo, como se diz vulgarmente, a história do “encalhado”.

            Logo nas primeiras cenas reparamos que Marty tem uma simpatia peculiar. Trabalhador, brincalhão com os fregueses no açougue, falador, entrosado no ambiente da colônia italiana. Os amigos -tem amigos que o apreciam- convidam-no para os programas de sábado. Frequenta o “Poeira de estrelas”, uma versão anos cinquenta das nossas discotecas-danceterias de hoje. Mas não passa disso. Marty tem fundo, pensa e vive seu drama interior. Sabe que os seus amigos são tão tímidos quanto ele, mas tem lábia e presença. De qualquer modo o resultado deles é o mesmo: o insucesso com as moças, sem resultado estável, que vingue. Marty está farto dessa simulação, do programa sem objetivo, da pesca sem peixe. Está preso nas próprias limitações.

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A PRINCESA E O PLEBEU

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A PRINCESA E O PLEBEU. (Roman Holiday) Diretor: William Wyler. Gregory Peck, Audrey Hepburn. Eddie Albert. USA. l953. ll9 minutos.

Poderíamos resumir este filme assim: um romance entre um jornalista e uma princesa, que quer ser Cinderela por um dia. Mas tratando-se de um clássico, é preciso dizer algo mais, a começar pelo diretor. Wyler é um grande diretor, em sentido pleno. Sabe transmitir dramas e emoções, paixões e alegrias. Sabe filmar a vida, em todos seus gêneros. Desde a mulher má,  encarnada em Bette Davis (“Jezebel”, “A carta”), dramas humanos (“Os melhores anos da nossa vida”, “Chaga de fogo”), até épicos com heróis de provada virtude (“Ben-Hur”). Dele podemos esperar sempre um filme de qualidade.

            “A Princesa e o Plebeu” foi a descoberta de Audrey Hepburn, atriz genial, eterna menina, que associa ingenuidade e candura, com uma personalidade forte na interpretação. É uma atriz expressiva: diz tudo com os gestos, com o sorriso, com o olhar. Matiza, com sua mímica, as situações. Wyler sabe disto e tira partido. Audrey ganha seu Oscar com mérito. Gregory Peck desenvolve um papel que lhe quadra bem. Alguém disse que é pouco natural, talvez pôr ser desajeitado quando se movimenta. Mas, nos primeiros planos leva sempre vantagem. Peck é um ator para ser visto de perto, não em perspectiva de fundo. Por isso se encaixa bem nos papeis dramáticos, conflitantes.

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