Perfis da Espanha: Andanças culturais a propósito de um Congresso Internacional – Parte 1 de 4

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Contaram-me em certa ocasião que alguém se aproximou de Ortega y Gasset para lhe pedir algum tipo de explicação conceitual. O filósofo olhou para o interlocutor, sorriu e disse: “O que o senhor precisa é ler menos e viajar mais”. Este conselho se me fez presente no momento em que o nosso avião aterrissava em Madrid, no primeiro dia de Outubro de 2010 com um nutrido grupo de 19 pessoas, rumo a um Congresso Internacional em Málaga. O Congresso era, sem dúvida, o motivo central da viagem. Mas haveria oportunidade de visitar diversos locais e cidades na Espanha, ocasião de mergulhar na cultura e na historia. Uma viagem que, bem aproveitada, ajuda a entender o mundo, o ser humano, porque é sempre um diálogo enriquecedor.

Saindo do desembarque, lá estava o ônibus, que seria nosso companheiro fiel nas andanças espanholas. Situe-me no primeiro banco, fiz-me com o microfone e, sem demoras, comecei a falar. O grupo era numeroso e heterogêneo. Logo percebi que não seria possível que todos estivessem juntos sempre, prestando atenção, escutando as explicações que por ventura eu poderia dar. Mas entendi também que, de alguma maneira, esperavam a minha colaboração. Afinal, o convite para integrar a força tarefa na empreitada acadêmica tinha partido de mim. Assim, decidi que faria comentários no microfone para quem quisesse escutar, e ao longo do percurso e dos muitos passeios que nos aguardavam, conversaria com os que caminhassem do meu lado.  Contaria historias, pois essa é principal função de quem faz de guia. Trata-se de ajudar a ver, de facilitar o diálogo com a cultura que o panorama, completamente novo para a maioria, nos ofereceria.

2- 3 de Outubro: Madrid

Do aeroporto de Barajas, saímos rumo ao Hotel. Microfone ligado, adverti sobre a topografia de Madrid que, em outono, mostra-se com um clima particularmente acolhedor. Uma cidade construída com escala humana, para o homem, não para os veículos, que são muitos. Na verdade foram um amigo arquiteto e o meu irmão biólogo, os que me fizeram notar essas características da capital espanhola. Por isso, é agradável passear pelas amplas calçadas, regulares e bem cuidadas, sob a sombra das numerosas arvores –é a cidade melhor arborizada da Europa, segundo alguns- que perfazem um verdadeiro túnel verde na primavera e no verão; e no outono, com o cair das folhas, deixam filtrar-se o sol, para aquecer o ambiente. E à noite, uma luz âmbar envolve a cidade que continua vivendo até altas horas da madrugada. Os passeios noturnos em Madrid são inesquecíveis, tem um sabor único.

Passamos do lado da Porta de Alcalá e logo mais a Cibeles nos dava as boas vindas. “Eis um cartão postal de Madrid –comentei- e, lembrem, mais do que fazer fotos de paisagens e monumentos –que sempre terão inferior qualidade a qualquer foto oficial- façam fotos de vocês diante desses locais. Esse é um cartão postal que não está à venda”. Mesmo sabendo que o meu conselho não teria um alto impacto, a advertência foi válida: as inúmeras fotos –milhares, certamente- que se fariam nessa viagem, incluiriam algumas com pessoas, que são as que se lembram sempre com carinho.

Situados no hotel, que seria o nosso quartel geral nos próximos dias, dedicamos os dois primeiros a conhecer Madrid. Ou melhor, a passear pelas ruas, observar as gentes, contemplar monumentos. O grupo, como era de se esperar, não tardou em dispersar-se, em reunir-se, em dispersar-se novamente, para encontrar-se sempre no final do dia no hotel. Eu, sempre acompanhado, por estes ou aqueles, procurei não poupar comentários, histórias –muitas delas aprendidas na minha infância- que pudessem ajudar a apreciar a realidade da minha cidade natal. Caminhamos do hotel até Puerta del Sol, fazendo uma parada estratégica para almoçar num dos muitos bares que estão situados no caminho. Foi o primeiro contato do grupo com a culinária espanhola, que nos acompanharia nos próximos dias, representada emblematicamente nas famosas Tapas. “Pode-se pedir um almoço na Espanha, há inúmeras possibilidades. Mas quando o objetivo é passear e conhecer as cidades, a opção certa é tapear. “O que seriam as tapas?”- surge a pergunta obrigatória. Talvez petiscos, talvez quitutes, sei lá. As tapas são únicas, algo muito espanhol e, como mais de um já comentou, não há tapa que seja ruim.

Após cruzar pela Gran Via e chegar a Puerta del Sol, nos defrontamos com a estátua do Urso e do Madronho, símbolo de Madrid, pois é dessa árvore que a cidade empresta o nome. No centro da praça, a estátua de Carlos III, o rei Bourbon responsável pelas melhoras urbanísticas na capital de Espanha, o que lhe valeu o titulo do “melhor prefeito de Madrid”. De lá, não sem antes parar na famosa confeiteira “La Mallorquina” (desde 1894) onde compramos uns doces típicos, nos dirigimos à Plaza Mayor, com parada obrigatória para um café.

O percurso clássico no Madrid de los Austrias –assim chamado porque corresponde à época dos séculos XV- XVII, reinado dos Habsburgos na Espanha- , nos leva da Plaza Mayor, pela Calle Mayor, até o Palácio Real, que nos faz mudar de cenário e dinastia, introduzindo-nos no Madrid dos Bourbons. O Teatro da Opera, de frente ao Palacio,  a Catedral de la Almudena, do lado esquerdo e os Jardins de Sabatini no lado direito, desenham um outro cartão postal da cidade. Como andávamos com o tempo um pouco justo, e queríamos pegar o Metro em Opera, atravessamos a praça onde estão situados os reis godos –não faltou uma primeira aula sobre a história de Espanha, quando Espanha ainda não existia como tal. Leovigildo, Recaredo, e um chamado de atenção sobre D. Pelayo, com quem depois encontraríamos no seu habitat nas montanhas de Covadonga. O nosso dia finalizou numa Jamoneria (cervejaria onde há tapas, e se vendem jamones, outra personagem importantíssima que foi apresentada ao grupo nesta viagem, com grande sucesso).

Ainda em Madrid, o dia seguinte, nos brindou a oportunidade de passear pela cidade, pois o tempo –encoberto, mas agradável- o permitia. Descemos pela Gran Via, até encontrar Alcalá, cruzamos por Cibeles e, na altura da Puerta de Alcalá, entramos no Parque do Retiro. As explicações históricas sobre o parque, construído na época de Felipe IV, privativo dos reis, aberto muito depois à nobreza, e finalmente ao público, também se fizeram necessárias. Paramos para tomar um café na frente do estanque, onde já tínhamos aprendido que em tempos em que o parque era destinado ao retiro dos reis, estes se divertiam simulando batalhas navais no pequeno lago.

O passeio pelo Retiro, com saída na porta da Cuesta de Moyano, nos fez passar diante da estátua do Angel Caído, que chamou a atenção do grupo. Em Atocha –uma lembrança ao atentado de 2004- enveredamos pelo passeio da Castellana de volta para Neptuno. Começou a chover e decidimos pela melhor opção: entrar no Museu do Prado, e gastar um par de horas por lá. Fiz uma advertência: “Não adianta quere ver muitas coisas. Sugiro Velazquez, y Goya, para mergulhar na pintura espanhola”. Na verdade, tivemos também oportunidade de ver algo de Murillo e de El Greco. Quando saímos, a chuva tinha parado, e o cansaço impunha volta ao hotel e um descanso merecido.  Mas, não para todos: houve quem foi assistir ao jogo do Real Madrid que nesse domingo era ás 9 da noite. E quem foi não se arrependeu: uma goleada de 6 x 1 para o Real, coisa que fazia muito tempo não se via no estádio Santiago Bernabeu.

4 de Outubro: El Escorial, Segovia, Ávila

Os dias que permanecemos em Madrid antes de sair para o Congresso Internacional que teria lugar em Málaga tinham decidido conhecer locais situados a pouca distância da capital espanhola.

Assim, o primeiro dia saímos rumo ao Escorial, para visitar o Monasterio e Palácio estabelecidos a pouco mais de 50 km. de Madrid. Era segunda feira e estava fechado, de modo que não pudemos visitá-lo por dentro. Mas, o ambiente majestoso da arquitetura de Juan de Herrera, impunha uma explicação que, conforme nos aproximávamos da cidade, brindei com a ajuda do microfone.

A iniciativa desta construção que é todo um símbolo do Império Espanhol, partiu de Felipe II quando em 1557 derrotou os franceses na batalha de São Quintin, no dia 10 de Agosto. Esse dia, a Igreja celebra a festa de São Lourenço, um mártir romano dos primeiros séculos do cristianismo, que foi queimado numa grelha. Daí a forma de grelha invertida –as quatro torres são os pés da grelha- que apresenta o conjunto arquitetônico, em honra de S. Lourenço, que também dá nome ao Real Sitio de São Lourenço del Escorial. Lá estão enterrados, no Panteão, os principais reis da Espanha, com as rainhas consortes; e, quando o rei foi casado com várias rainhas, a escolha recai sobre aquela que foi mãe de um futuro rei. Reis e mães de reis: eis o critério que permite ser enterrado no Panteão real de El Escorial.

Passeamos pela esplanada, ao tempo que respondia as perguntas sobre essa época do Império espanhol, onde “o sol não se punha nunca”. Como assim? –perguntou alguém. “Repare, quando anoitecia nas Filipinas (que, por sinal, se chamam assim por conta de Felipe II), amanhecia no Peru, pois tudo isso era território espanhol no século XVI”. A famosa biblioteca de El Escorial, onde se guardam obras originais –por exemplo, o livro da Vida de Santa Teresa-  também foi objeto de comentários. E, naturalmente, a sala do Trono que contrasta na sua simplicidade com a riqueza da Basílica. “Fiz um palácio para Deus e uma choupana para mim” –respondia o Imperador Felipe II quando lhe interrogavam sobre esta questão.

Uma pergunta, no meio do passeio, surpreendeu-me. Um estudante se aproxima e me interroga: “Por que queimaram a esse São Lourenço?”. “Como assim? Era um mártir!” – respondi. A perplexidade que o meu interlocutor refletia no olhar me fez perceber que a explicação dada no microfone do ônibus, dava por sabidos conceitos que mereciam um repasso.  E assim o fiz, quando de novo no ônibus, rumo a Segovia, fiz um pequeno resumo dos primeiros três séculos de Cristianismo, as perseguições e os mártires, a paz de Constantino após vencer a batalha da Ponte Mílvia, seguindo o emblema da Cruz: “In hoc signo vinces”.

Em Segovia –como em todas as cidades que visitaríamos depois- os ônibus não podem circular no Centro, de modo que fomos obrigados a descer no estacionamento reservado para esses veículos, e caminhar a pé. Fizemos uma foto oficial na praça, tendo como fundo o Aqueduto romano, símbolo da cidade, construído há mais de 2000 anos. Tem mais de 800 metros de comprimento, quase 200 arcos, e as pedras que o integram encaixam apenas forças geométricas, sem uso de nenhum tipo de cimento. Sempre tirando lições da história, se comprova como as coisas bem feitas superam a barreira do tempo.

Subimos até a ponta lateral do aqueduto e de lá caminhamos para ver a Catedral, de estilo gótico tardio e, posteriormente,  nos dirigimos até o Alcázar. O Alcázar de Segóvia –outro símbolo da cidade- e um castelo-palácio que foi construído no século XII, e reformado múltiplas vezes, até o século XIX. Seu perfil peculiar inspirou Walt Disney para desenhar o Castelo de Disneyworld que todos conhecem: de fato, quando estivemos à frente dele, notamos que para todos era familiar.

Em Segovia Isabel a Católica foi proclamada Rainha de Castela, e também de Segovia saíram importantes apoios na guerra das Comunidades (Comuneros), que enfrentaram as tropas do jovem Imperador Carlos V (de Alemanha), neto da Rainha Isabel, quando veio à Espanha dos países baixos (nasceu em Gante) para ocupar o trono da Espanha. As Comunidades de Castela foram derrotadas, e Carlos assumiu o trono e o título de Carlos I da Espanha: ele seria o pai de Felipe II.

As visitas que fizemos a todas as cidades tiveram sempre a limitação do tempo: poderíamos ver muitas coisas, mas sem tempo de nos deter nos detalhes. Por isso a recomendação que fiz desde o começo: “Esta viagem oferece a oportunidade de ter uma visão geral de muitas cidades da Espanha, mas não haverá tempo de parar, entrar para visitar cada monumento ou museu. Temos de fazer uma opção, e a mais sensata parece a de obter uma perspectiva global das cidades, e dos destaques de cada uma”.

Mas os passeios pelas cidades de Castela nos ofereceram a oportunidade de entender e reconhecer os principais estilos arquitetônicos que se replicam ao longo das ruas. Muitos foram os comentários que, fruto das lembranças que tinha das classes de história da arte –tive excelentes professores na matéria- fui tecendo conforme caminhávamos de um lado para outro. O estilo românico, que surge num canto de uma praça, ou dobrando uma esquina. Sólido, pesado, escuro, quase sem janelas, como reflexo de uma espiritualidade que muito tinha de temor, e não se atrevia a levantar o olhar aos céus. As virgens românicas, sentadas, com a criança no colo, amparando-a, mas de olhar distante. O majestoso gótico –inicial, tardio, ou isabelino- com suas altas torres, agulhas, arcobotantes que apóiam a audácia da altura que se eleva, em petição confiada. Luz, muita luz entrando pelos seus vitrais, e as virgens deixam de estar sentadas, se incorporam de pé, e o menino desloca-se lateralmente, entre os braços, enquanto os olhos de Nossa Senhora estabelecem o diálogo com o interlocutor que acode à sua intercessão. Os monumentos mudéjares, ou mouriscos, dos árabes que morando em território cristão mantinham a sua própria cultura que se refletia na arquitetura. O estilo mozárabe, de cristãos que viviam em território dominado pelos árabes, e também plasmavam a cultura em monumentos próprios.

Ainda nos aguardava outra visita geral antes de regressar a Madrid. Paramos num bar para uma rápida refeição –sempre com base em tapas e sanduíches- e partimos para Ávila.

Ávila surge com o perfil inconfundível conforme nos aproximamos dela. As muralhas se recortam no horizonte, rodeiam toda a cidade antiga ao longo de 2500 metros, com 85 torres e mais de 2000 alméias. São talvez as muralhas medievais melhor conservadas do mundo.

O nosso passeio ao redor das muralhas teve uma parada obrigatória junto à estátua de Santa Teresa, natural da cidade. Seguindo a tradição as mulheres do grupo fizeram uma foto junto da estátua, prestando assim homenagem –e pedindo ajuda- a esta mulher do século XVI que teve voz de comando, personalidade, e liderança num universo predominantemente masculino.

Antes de sair, houve quem seguiu a recomendação de comprar as Yemas de Santa Teresa, uns doces de ovos típicos da cidade. No final da tarde, voltamos a Madrid, após um percurso de 200 km e com uma enorme quantidade bagagem cultural que, certamente, terá o seu desdobramento com o passar dos anos. A cultura –como os monumentos que contemplamos, como as catedrais- não se improvisa a modo de fast-food. É preciso o decantar do tempo, o cultivo do espírito, a familiaridade com a história.

5 de Outubro: Toledo

Dedicamos o seguinte dia a Toledo, outro ponto obrigatório para quem passa alguns dias em Madrid. Situado ao sul de Madrid, a 50 km, Toledo é também outro monumento patrimônio da humanidade. Capital imperial nos tempos de Carlos I e de Felipe II (que trasladou a capital a Madrid, a finais do século XVI), foi também capital dos Visigodos, a partir do século V.

Toledo é o símbolo do convívio de culturas e religiões: judeus, muçulmanos e cristãos. E desse convívio resulta o encanto especial de Toledo. Suas ruas estreitas – na juderia, o bairro judeu-, seus inúmeros monumentos cristãos –como a Catedral, de estilo gótico, sede do Primaz da Espanha- que possui um museu de arte sacra fabuloso. Toledo que, no dizer de Marañon, tinha na época de El Greco quase 100 monumentos religiosos entre conventos, igrejas, catedrais, mosteiros e basílicas. A cidade, na época, no final do século XVI não tinha mais de 40 mil almas. As ruas de Toledo respiram um ar medieval, onde se percebe o aroma dos séculos. E também um ambiente de lenda, de romance, de amores –sadios e proibidos- e o ruído dos próprios passos, quando se caminha sozinho, parece mesclar-se com o tilintar das espadas de algum duelo de cavaleiros que estavam tirando a limpo a questão da honra de cada um.

Mas não teríamos tempo de contemplar os detalhes e nos focamos numa visita geral à cidade. A praça central, Zocodover, à qual chegamos caminhando porque o ônibus não pode circular na cidade. Do lado da Praça o Alcázar de Toledo, que permanece fechado, pois deve se converter num museu do exército espanhol.

Relatei o episódio da resistência do Alcázar durante a guerra civil espanhola. As tropas nacionais foram cercadas pelas republicanas que tinham como refém ao filho do general que comandava as tropas do Alcázar, e ameaçaram com matá-lo caso não entregasse a fortaleza. O general Moscardó manteve-se firme e contam que até jogou a arma dele do alto do Alcázar dizendo que não o entregaria nunca e que se não havia armas para executar o próprio filho ali estava a dele. Fiz notar que, apesar do desprestígio das figuras que lutaram do lado de Franco na guerra civil na Espanha de hoje, governada pelos socialistas, o nome do General Moscardó se mantém na rua lateral do Alcázar, como símbolo de uma coragem impar.

Toledo é também a cidade de El Greco, pintor do século XVI que viveu e morreu lá. Muitas das suas obras se encontram em Toledo, mas como o tempo urgia nos decidimos por uma das imprescindíveis: “O enterro do Conde de Orgaz”, na Igreja de São Tomé. Permanecemos contemplando o quadro –que se mantém perfeitamente desde o século XVI- com os seus dois planos – o terreno e o celestial -, as figuras alongadas representativas do estilo místico de El Greco, o convívio de cavalheiros com os santos, os mortais e os que já estão na glória, e o anjo carregando a alma do senhor de Orgaz, como se de uma criança se tratasse-, ajudando no parto para o mundo celestial.

Uma surpresa muito especial nos esperava em Toledo. Nesse mesmo dia, no final da tarde, se inauguraria a exposição dedicada ao cinqüentenário da morte de Gregorio Marañón, médico, humanista, escritor, um símbolo da cultura espanhola. A exposição vinha sendo realizada em várias cidades, e agora era a vez de Toledo, cidade muito querida de Marañón. Lá tinha o famoso médico uma casa de campo –um cigarral, assim se chamam em Toledo essas casas campestres- e lá escreveu a maioria dos seus livros. Entre outros, “El Greco y Toledo”, onde Marañon realiza uma análise profunda do pintor e afirma que foi Toledo quem ajudou a desabrochar a pintura mística de El Greco, e lhe possibilitou o crescimento artístico.

A exposição seria inaugurada à noite, mas o diretor –conhecido nosso- teve o fantástico detalhe de abri-la para nós no final da manhã. E ali, em 45 minutos, Antonio López Veja, Diretor da Exposição e uma das maiores autoridades na vida e obra de Gregorio Marañón, nos brindou uma visita guiada, com explicações, comentários e histórias que resultou num evento inesquecível, além de ser um verdadeiro banho de cultura. Em todos os que assistimos ficou gravado o seu comentário inicial: Marañón era um liberal, um homem que convivia e se entendia com todos, mesmo com os que pensavam de modo diferente; e colocou essa divisa como norma da sua vida e os seus talentos e prestígio enorme ao serviço da sociedade. E aprendeu o espírito liberal na sua casa, onde contemplava como os intelectuais que de manhã publicavam na imprensa idéias contrárias, eram capazes de tomar café com o seu pai, de tarde, em animada tertúlia (Leia os comentários sobre Marañon feitos por um dos estudantes que esteve na exposição). Foi um verdadeiro privilégio, com fecho de ouro: Antonio nos entregou o catálogo da exposição, com uma dedicatória carinhosa para a SOBRAMFA. O Catálogo incluía um DVD com muitos dos comentários que já nos tinha brindado, e tivemos oportunidade de vê-lo no ônibus no dia seguinte, rumo a Andaluzia.

Nesse dia, saindo da exposição, almoçamos todos juntos. Uma conversa animadíssima, de um par de horas, para preparar o congresso que começaria o dia seguinte: os integrantes foram expondo as expectativas, as dúvidas, os sonhos que trouxeram na viagem. As tapas circulavam na mesa redonda que tivemos de improvisar – houve certa confusão no restaurante, pois éramos 19- e as conversas fluíram com naturalidade….mas em inglês!! O Dr. Josh Freeman e a sua esposa Patricia Kelly, que integraram nosso grupo nesses dias, foram os moderadores e todos tiveram que ajeitar-se para expor em inglês as suas idéias. Foi outro momento inesquecível, no ambiente Toledano, tão propício para conversas humanísticas, e para os sonhos que envolvem como nuvem a cidade do rio Tejo.

Antes de regressar a Madrid, houve a dispersão típica em busca de lembranças. As recomendações já tinham sido dadas: Marzipão (produto de amêndoas, típico de Toledo) e as bijuterias “damasquinadas” (em preto e ouro), outro símbolo toledano. Naturalmente houve quem pensou em comprar alguma espada de souvenir, mas ninguém se decidiu pensando que não seria simples voltar em avião com uma espada de Toledo na mala.

É possível humanizar a Medicina? Reflexões a propósito do uso do Cinema na Educação Médica

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O artigo “É possível humanizar a Medicina? Reflexões a propósito do uso do Cinema na Educação Médica”, de minha autoria, foi publicado na revista O Mundo da Saúde, v. 34, n. 3, do período de julho/setembro de 2010.

Veja o resumo a seguir e faça o download do artigo em PDF.

A questão central do presente artigo traduz-se numa pergunta: É possível humanizar a Medicina? A já longa experiência que o autor possui no uso do Cinema na Educação Médica –em âmbito nacional e internacional- brinda elementos para responder essa questão vital. E a resposta chega desdobrada, a modo de fatorial de um produto, em outras questões menores e nas correspondentes respostas. Em primeiro lugar: O que é preciso humanizar? Projetos de humanização que não atingem a pessoa, o ser humano, restringindo-se ao âmbito de políticas públicas, não são bem sucedidas. A seguir, coloca-se a segunda questão: Como se humaniza com eficácia? Não basta a boa vontade, e a dedicação entusiasta, para conseguir humanizar de modo sustentável. É preciso metodologia. Em terceiro lugar, uma questão pouco ventilada nos fóruns humanizantes: Quanto custa humanizar? Enquanto se continue destinando os maiores orçamentos à tecnologia, e se deixem as tentativas de humanização por conta do voluntariado e sem o apóio de investimentos financeiros, não será possível a transformação que a humanização pretende. Finalmente, a questão crítica: Queremos, de verdade, ser humanizados? Porque humanizar implica chegar ao âmago do ser humano, que protagoniza todos os processos de saúde, transformá-lo, criar um compromisso de ordem pessoal, enfrentar desafios profissionais e pessoais. Humanizar é, pois, recolocar-se na vida como pessoa, assumir uma postura humanística, para deste modo fazer do próprio existir um foco de humanização efetiva: na medicina, e na vida.

Aos Cem Anos da Morte de Machado de Assis

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Por Sérgio Sardinha de Azevedo

    No dia 29 de setembro de 1908, o Rio de Janeiro assistia à morte do maior escritor brasileiro: Machado de Assis. Com ele, a literatura brasileira havia conhecido não somente um estilo novo mas, sobretudo, uma acuidade intelectual penetrante, com maturidade suficiente para analisar e compreender personalidades, acontecimentos, instituições e correntes de pensamento.

    Quando Machado morreu, o século XIX havia terminado há pouco tempo, deixando como legado o materialismo, o cientificismo, o ateísmo, o agnosticismo e uma enxurrada de “ismos” que afogou diversas mentes promissoras. No entanto, Machado ensinara a desconfiar dessas escolas de pensamento, desarticulando seus longos raciocínios com um olhar irônico. Permanecia, porém, a dúvida: “Todos os “ismos” simplesmente não passam de um: o pessimismo?” Machado não respondeu essa pergunta. Assim como Brás Cubas não transmitiu “a nenhuma criatura o legado da nossa miséria”, Machado morreu sem legar à posteridade a solução do enigma.

    Enquanto o corpo de Machado de Assis atraía uma multidão de visitantes à sua casa no Cosme Velho, vivia na então capital do País um menino chamado Gustavo, estudante do Colégio Pedro II. Destinado a receber a forte influência do pensamento do século XIX, passaria do cientificismo para o materialismo, defenderia o ateísmo e se perderia nos labirintos do agnosticismo. Nas letras, teria sempre Machado como seu mestre. Tornando-se escritor, devido a um de seus livros em que analisa a obra machadiana, seria elogiado por ninguém menos que Manuel Bandeira, o qual afirmaria que ele havia escrito “um dos livros mais belos e mais fortes de nossas letras”.
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Marta Braga: “Lições de Gustavo Corção”

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Marta Braga: “Lições de Gustavo Corção”. Quadrante. 2010. 139 pgs.

    Este livro –uma agradável surpresa que não esperava- brindou-me a oportunidade de lembrar, com imenso carinho, a obra de Gustavo Corção. Voltei a viver momentos inesquecíveis, da ha mais 30 anos, quando, recém chegado ao Brasil, fiz as minhas primeiras incursões na literatura nacional. Posso dizer que Corção tem sua parte de responsabilidade na minha formação –como médico, como professor e também como amador nas aventuras humanísticas- e, sem dúvida, foi um interlocutor necessário de um Brasil que aprendi a amar naquela altura. Um Brasil claro, diáfano, com os seus defeitos, como qualquer povo, mas alegre e sincero. E no meio dessa descontração, dessa jinga que se estendia do futebol ao samba, envolvendo também as relações humanas – a insuperável afabilidade do povo brasileiro!- havia quem pensava e escrevia de modo claro e elegante. Valha o exemplo quando descreve os tempos em que Corção e um grupo de intelectuais arquitetavam uma revolução contra a burguesia que “naturalmente dava uma trégua para almoçar, pois e difícil manter essa atitude diante de uma mesa posta, e de uma senhora que se desculpa por causa do pudim que se partira na forma”.

    Foi um amigo quem me recomendou Corção. “Não deixes de ler seus livros. Continua escrevendo no jornal, é muito criticado, ficou um pouco azedo, mas é contundente. Além do que escreve muito bem; ajudará a melhorar o teu português!”. Agradeço de por vida essa recomendação. E, aos poucos, fui lendo as principais obras de Gustavo Corção, anotando idéias, recolhendo fichas que utilizei –e utilizo até hoje- nas minhas aulas e nos escritos que me atrevo a publicar aqui ou acolá. Agora, lendo este livro de lembranças, vejo que a autora recolhe trechos que eu também tenho anotados nos meus fichários. Senti falta de outros, mas é inevitável: cada um apanha aquilo que mais lhe afeta, o que lhe atinge e por isso mesmo lhe servirá para construir-se e ajudar os outros na sua formação.

    Passados muitos anos, relendo estas páginas com o sabor da experiência de vida, entendo que naquele Brasil que aprendi a amar, talvez as formas de dizer dos intelectuais nem sempre foram felizes, e enfrentaram críticas, suscitaram polêmicas. Mas, sem dúvida, havia conteúdo. Hoje, vivemos tempos onde todos se comunicam, falam, opinam, mas o que falta mesmo é conteúdo. Somos especialistas em comunicar-nos, em delivery –seja de pizza ou de qualquer outra coisa- mas carecemos de substância. Estamos rodeados de uma cultura epidérmica onde graça a mediocridade, mesmo em ambientes acadêmicos. Tudo é rápido, direto, sempre na versão mais atualizada, com pavor de ficar anacrônico, nem que seja por minutos. Vem a minha cabeça uma frase de Corção que tenho anotada num papel, já amarelado pelo tempo, mas de contundente atualidade: “A novidade é o bálsamo das vidas vazias”.

    E nos cenários acadêmicos, nas usinas formadoras –sejam os colégios, a universidade, a própria família e grupos afins- faltam referencias de cultura, pessoas que saibam integrar os conhecimentos e os transmitam de modo claro, convidando a pensar, pois é a resposta do educando diante das questões oportunamente colocadas pelo mestre o que de fato lhe cultiva, lhe faz crescer. Temos especialistas, sim; de tudo. Tem quem sabe muito de esporte, ou de vinho, ou de pintura, ou de computadores, ou de cinema, teatro e literatura. Mas é um saber setorial, enorme talvez, cachoeira de conhecimentos que afoga mas não refresca. Falta a harmonia de conhecimento, que cria um ambiente agradável onde o espírito humano consegue se desenvolver. São mutirões de conhecimento por atacado, que não se integram na vida real, porque ninguém sabe fazê-lo: nem aquele que detém o conhecimento –que costuma ser um ignorante em quase todas as outras matérias da vida- nem, muito menos, quem ouve por não saber por onde deve começar para incorporar tamanho volume de informação, e qual a proporção necessária para melhorar sua cultura. Como bem adverte Corção “uma filosofia que não pode ser vertida em conversa familiar, ou em história contada às crianças” é cultura de laboratório, não da vida.

    Este livro será uma descoberta para muitos. Outros, como no meu caso, o lerão de corrido, tropeçando com os pensamentos que alimentaram sua cultura no seu dia, que é tanto como dizer, idéias que ajudaram a posicionar-se na vida. Pois a cultura é isso: um saber posicionar-se no mundo, começando pela vida própria, pelo conhecimento próprio, outro dos temas favoritos de Corção. Encontro este parágrafo numa ficha, esta sim, já transcrita no computador. “Acho belíssima essa voracidade do homem, e essa capacidade de trazer para casa, para a sala de estar, sob as espécies do assunto, as guerras, os terremotos e os ciclones. Por outro lado, porém, acho lúgubre essa avidez de engrossar por fora a ganga do eu, numa capitulação da maior das aventuras, que é a conquista de si mesmo, a descoberta de sua própria alma. Há duas iluminações na face de um Marco Polo: de um lado o brilho ensolarado da boa aventura; de outro a verde lividez do homem que foge de si mesmo.” Ler, ou reler, Corção: eis o recado importantíssimo que nos brinda esta obra –um acerto editorial- que é um trailer de um filme apaixonante.

O Concerto: Arte e Beleza que nos abrem à Esperança

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     Voltei de uma viagem com o nome do filme na agenda. Não o conhecia e logo vi que não seria fácil de conseguir, pois não constava nos catálogos nacionais que costumo consultar. Mas, finalmente, me fiz com ele, coloquei-o no computador, e esperei a ocasião. Não apenas ter tempo, mas sim disposição. A minha não era das melhores.

     Um filme, igual que um livro, pode ser ótimo, mas tem o seu momento; enfrentá-lo quando falta sintonia, rende dividendos equivocados, julgamentos indevidos. E, o que é pior, perde-se uma ótima ocasião de estabelecer um diálogo com ele, de aprender e inspirar-se. A arte é isso: uma provocação ao diálogo interior, saber freqüentar nossa intimidade, tirar dali forças e sentido para viver a vida com categoria. A vida supera a arte, mas para viver bem, a beleza que nos chega pela arte é imprescindível.

     A ocasião surgiu no passado domingo. Estava saindo de casa para jogar tênis com um amigo, quando tocou o telefone. “Desculpe, tive um imprevisto, não vamos poder jogar”. E agora? Tudo o esquema arrumado para a manhã de Domingo. Há sempre a possibilidade de buscar outro parceiro, mas de última hora, as chances de sucesso são pequenas. Fui dar uma breve corrida –afinal estava com indumentária esportiva, e trocar-se sem fazer esporte tem sabor de fracasso- e voltei pouco depois. Nesse momento, lembrei do filme e, curiosamente, me senti inspirado. Deixei rodar o filme e, em poucos minutos, estava conquistado. A música me convidava ao diálogo.
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William Faulkner: “Absalão, Absalão”

Staff Livros Leave a Comment

Faulkner canta e sonha o Sul profundo americano. Não é uma descrição, mas um delírio sulino onde os protagonistas são o destino, as paixões humanas, a miséria e a compaixão, que se apóiam em personagens que servem de mera desculpa para encarnar todas as atribulações humanas. Por isso, as personagens não se visualizam racionalmente, apresentam-se como atemporais, e a narrativa –que não parece lhe interessar ao autor- vai e volta no tempo, sem advertências, numa mistura bizarra de momentos e locais. Traços psicológicos a modo de um quadro impressionista que deixam entrever, como pano de fundo, o Sul denso, perdedor da guerra, envolvido numa saudade que Faulkner não quer dissimular nem prescindir. Um livro de difícil leitura, complicado, impróprio para quem busca um romance com argumento e personagens definidos. É a evocação do autor, com a autoridade que lhe confere o premio Nobel, mas também com uma peculiaridade muito especial. É possível que a tradução desta edição não ajude. Pensei, até, em como seria traduzir mal Guimarães Rosa, que sonha o sertão e os jagunços, para o Inglês. Talvez resultasse algo análogo, embora o autor brasileiro seja muito mais rico em considerações e pensamentos que enriquecem a narrativa. Ler Faulkner é sempre um arriscar um mergulho psicológico nos abismos da alma, uma alma que parece carecer de corpo, porque talvez o corpo seja o sul confederado, perdedor, orgulhoso, altivo.

O Seqüestro do Metrô 1 2 3 – Liderança Interior: Os deveres que ninguém nos cobra

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The Taking of Pelham 1 2 3. 2009 Diretor: Tony Scott. Denzel Washington, John Travolta, Victor Gojcaj, John Turturro, James Gandolfini. 121 min.

     Este filme me fez pensar. A esta altura, com muitas horas de cinema vividas, não perco mais tempo classificando os filmes em bons ou ruins. Afinal, teríamos que definir o que é bom, ou melhor, saber para o quê são bons. Há filmes que te fazem pensar e outros que passam –como diziam os clássicos espanhóis- sem pena nem glória. Acabam nos créditos, sem deixar nenhum eco pairando na nossa mente. Quando as mergulhadas no cinema estão, como no meu caso, assumidamente formatadas na procura de valores, classificar os filmes em função da reflexão que provocam, parece-me muito mais adequado. A vida busca na arte a expressão plástica de algo que agregue valor ao viver, modelos que nos empurrem a viver com melhor qualidade, mais intensamente. Mais humanamente, me atreveria a dizer.

     Nunca fui um admirador do Tony Scott, mas parece que Denzel Washington se dá bem com o diretor britânico, pois fizeram vários filmes juntos, sempre com muita ação, espionagem, suspense. Aventuras variadas que servem como passatempo, sem nenhuma outra pretensão. Esta é mais uma entrega da dupla, embora careça desses ingredientes. O argumento é simples: o seqüestro de um vagão de metrô, e a negociação para o resgate dos passageiros. A ação é mínima, o suspense é irrisório. Tudo corre por conta de um Travolta bandido ilustrado, e não há mocinho que lhe dê o troco. Mas tem pegada. Notei-o depois, quando as cenas voltavam à minha mente; mais do que as cenas, as atitudes do protagonista, que tem vocação de anti-herói, mas pega o touro pelos chifres. E o touro não é o bandido, mas o próprio dever que ele se impõe.
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Daniel Innerarity. “Ética de la hospitalidad”

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Daniel Innerarity . “Ética de la hospitalidad’. Península. Barcelona 2001. 222pgs

Livro fascinante, instigador, uma aluvião de idéias que pedem desdobramento. Posto deste modo, o conteúdo é infindável, pois depende da interação do leitor, das reflexões que seja capaz de alinhavar no vácuo dos enunciados e afirmações, muitas vezes surpreendentes, sempre desafiadores. Não é um livro fácil, embora não seja de difícil leitura; talvez um livro incômodo, que dá trabalho, porque obriga a pensar, a voltar sobre as idéias uma vez e outra. Mas no final desse esforço, experimenta-se alegria, conforto, e até prazer.  O gozo da descoberta intelectual como caminho percorrido pelo leitor que interage com os desafios que o livro lhe coloca. Um excelente sabor de boca que domina o paladar intelectual, e descortina novos horizontes. Afinal, tudo isso –tão simples e tão complexo ao mesmo tempo- é a construção do que o autor denomina a ética de hospitalidade. Uma postura que não diz respeito ao comportamento que devemos assumir naquilo que planejamos, mas sim naquilo que nos acontece, que entra na nossa vida sem nos pedir licença e que costuma ser o que predomina. A maior parte da nossa vida compõe-se de coisas que nos acontecem, mais do que de coisas que planejamos; estar disposto, em postura de aceitação e crescimento para essas primeiras, é o núcleo da ética da hospitalidade: uma ética do acolhimento; de pessoas, de coisas, de circunstâncias. Alguns textos que se recolhem a seguir esboçam uma idéia deste livro singular.

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Um Sonho Possível. Liderança 360° em Versão Feminina.

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The Blind Side. 2009 Diretor: John Lee Hancock. Sandra Bullock , Tim McGraw , Quinton Aaron, Jae Head, Lily Collins. 128 min

        Algumas semanas atrás um amigo deu-me o filme na mão: “Vás gostar. É desses filmes que você gosta de comentar, valores, tudo isso”. Vi o filme, gostei, mas ficou por isso mesmo. Confesso que não entrou na minha lista de pendências. Pouco depois, outro amigo perguntou-me se o tinha visto. Assenti, sem muito entusiasmo. Ele tinha assistido no cinema, junto com os filhos. “Impressionante a força dessa mulher que consegue envolver toda a família num projeto audacioso. E o curioso é que não impõe nada; tudo é muito natural porque contagia o marido e os filhos com o seu entusiasmo. Ela é encantadoramente determinada.” Foi uma pista importante; comecei a refletir. Finalmente, na semana passada, durante a viagem para um congresso internacional, um dos colegas que me acompanhava, assistiu no avião e me disse: “Bom filme esse do Oscar da Sandra Bullock. Tem pegada”. Foi o suficiente para rever minha lista de pendências e modificá-la. Assisti de novo, agora calibrando os detalhes. Os comentários dos amigos tinham dado a largada à reflexão que, nessa altura, já acumulava idéias. Muitas, uma atrás da outra.  Mas, perguntei-me, como é que isto passou batido?
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J.D. Salinger: “Franny & Zooey”. Editora do Autor. Rio de Janeiro. 1970

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Salinger é um autor “Cult”, o que significa que todos se sentem no direito de opinar e vasculhar o significado dos seus escritos. Depois da sua recente morte, o tônus “Cult” aumentou. Acerca deste livro já se escreveu muito. Há quem diga que é uma discussão de caráter religioso, outros uma busca de sentido, outros um ensaio psicológico que mais se assemelha a um teatro do que a um romance. De qualquer forma, não é o caso de recolher opiniões alheias, pois cada um pode facilmente encontrá-las postadas aqui e acolá na Internet. E todos têm direito –apelamos para o Cult- de emitir a sua. A minha não é uma opinião, mas sim uma sensação que tive enquanto lia o livro. Os modos variados do carinho que é possível ter numa família. Para a nossa sensibilidade latina, o aparente pouco respeito com que Zooey trata à mãe e a indiferença com relação à irmã Franny, mergulhada numa neurastenia existencial, são chocantes. Mas a mãe e a irmã não se assustam – como o leitor desavisado-, encaram com naturalidade as grosserias de Zooey, e tiram partido frutuoso dessa relação. Existe carinho, amor verdadeiro. Mesmo que as formas não ajudem. E a sensação me fez pensar que as formas doces –tantas vezes sem conteúdo- de nada servem, quando se trata de ajudar. Sim, é possível chorar com quem chora, e até oferecer um lenço; mas quem sofre tem o direito de esperar que também se lhe facilite saídas honrosas, uma luz no fundo do túnel, esperança sólida, sentido da vida. Uma passagem pelos velórios –que todos, antes ou depois acabamos freqüentando- confirma esta idéia. Sobram condolências e faltam esperança e sentido diante do sofrimento. Falta também criatividade na hora de ajudar. E fortaleza. Lembrei-me do amor de Chaplin por Teresa, em Luzes da Ribalta, que chega até a bofetada que facilita a entrada no palco da dançarina em estado de choque. São muitas sensações –dos velórios até Chaplin- mas é o que dá ler autores Cult. Em qualquer caso, um belo exercício mental de reflexão, sem espaço para a perda de tempo.