Daniel Pennac: “Diário de escola” (Chagrin d’école). Ed. Rocco, São Paulo, 2008. 240pgs.
O escritor francês Pennac, que foi péssimo aluno e depois se transformou em professor apaixonado, nos brinda uma obra de interesse para todos os que se aventuram a ensinar. Recolhe lembranças pessoais –que ilustram o seu mau desempenho escolar- com reflexões que se convertem em conselhos para os professores. O protagonista é sempre o aluno difícil, o “tapado”, o revoltado, o mau elemento que não quer aprender. Pennac o enxerga com certa ternura, vendo nele a imagem de quem ele mesmo foi.
Lembra com carinho de alguns professores que significaram um ponto de inflexão na sua trajetória de fracassos acumulados. E aqui chega o conselho que é um desafio para quem pretende a excelência na educação: Basta um professor – apenas um!- para nos salvar de nós mesmos, e fazer-nos esquecer os outros professores que atrapalham (… Os professores que me salvaram –e que fizeram de mim um professor- não estavam formados para fazê-lo. Não se preocuparam das origens da minha incapacidade, nem perderam tempo buscando as causas. Sentiram urgência, foram atrás de mim, e me tiraram do fundo do poço. Pescaram-me em tempo. Não se pode condenar o aluno sentenciando-o a um futuro triste; o professor “profeta” é destruído pelo autor, já que nada ocorre como está previsto: isso é o único que o futuro nos ensina quando se converte em passado. E costuma ser verdade que são os fracassos do professor –suas frustrações- as que se projetam no aluno a quem se destrata: O professor descontente com ele mesmo é o mais propenso a maltratar os alunos. Ensinar é, na visão do autor, envolver-se de corpo e alma, aceitar o desafio que cada aluno supõe; exigir-se ao máximo, sem despejar as culpas no sistema, na família, na educação deficiente que outros deixaram de dar àquela pessoa que, agora, cai em nossas mãos.
Colocar os cinco sentidos na hora de ensinar, sem aceitar distrações ou “considerar o ensino” como um apêndice profissional; um belo recado, necessário e atual. A presença dos meus alunos depende da minha: da minha presença real na classe e com cada indivíduo em particular; da minha presença na matéria que devo ensinar, da presença física, intelectual e mental durante os 55 minutos que dura a aula. (..) Aqueles professores que mudaram minha vida estavam possuídos pela paixão comunicativa da sua matéria. (..) Suas aulas eram atos de comunicação, sem dúvida, mas com um saber dominado até o ponto de que se tornava criação espontânea. O último capítulo –protagonizado pelo amor por ensinar- contém um divertido diálogo entre Pennac escritor hoje, e Pennac o mau aluno de outrora que adverte ao primeiro do verdadeiro perigo: os professores não estão preparados para a colisão entre o saber (deles, professores) e a ignorância (do aluno). Eles esqueceram como é “não saber as coisas”; recuperar, de algum modo, essa perspectiva e sentir o estado de ignorância, são condição para entender o aluno, para uma educação eficaz.