Los cuatro pilares de la medicina de familia

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La medicina de familia es la práctica médica centrada en la persona, no en la enfermedad. El médico de familia es el médico personal, el médico de cabecera como se le llamaba en otras épocas. En esos tiempos la medicina tenía que ser así o no era medicina. No había entonces otros recursos para atender al paciente, ni tecnología que nos pudiera distraer del enfermo para centrarnos en la molestia.

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A Arte Médica (II): a relação com o paciente

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Construir um bom relacionamento com o paciente requer do médico uma séria de disposições que se podem resumir no interesse real pelo paciente: ter presente que o paciente é sempre o protagonista do encontro clínico. A aparência externa do médico, apresentação agradável, discreta e transparente, facilita o relacionamento. A observação, a capacidade de escutar com paciência e abertura são também elementos imperativos para construir uma relação positiva que se reforça no momento do exame físico, elemento indispensável na liturgia do encontro médico-paciente. As palavras do médico, impregnadas de entusiasmo e convicção, são recurso também imprescindível para a construção de uma relação eficaz e terapêutica. Os erros médicos são, na maior parte das vezes, fruto da insuficiência humana por não ter sabido colocar em prática os conselhos aqui comentados. Publicações apontam evidências mostrando que, na prática, o médico não disponibiliza tempo suficiente para escutar o paciente. Aprender a fazê-lo não alongaria as consultas, mas as tornaria mais eficazes.

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A menina que roubava livros: um amor forte como a morte

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The Book Thief. Diretor: Brian Percival. Sophie Nélisse, Geoffrey Rush, Emily Watson, Nico Liersch, Ben Schnetzer. 131 min. (2013)

book_thief_capa     O título me entusiasmou. Não pelo ato de roubar –como se verá, a menina apenas empresta os livros-  mas pelo objeto do furto. Em tempos onde a corrupção trafega  solta, e criam-se nomes pomposos para disfarçar o que é roubo descarado, fazer dos livros objeto do desejo é, no mínimo, um ponto positivo. As pessoas vão atrás do dinheiro, do poder, da fama. A garota arrisca a pele por conta dos livros.

     A protagonista é Liesel, filha de uma mulher perseguida pelo governo alemão durante a segunda guerra. O serviço social germânico, sempre eficiente, confia a garota a um casal sem filhos: Emily Watson e um soberbo Geoffrey Rush, que melhora sua performance a cada filme. Essa é a pista de decolagem para um filme que é um belíssimo ensaio sobre a finitude e o amor.
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Alejandro Llano: “Caminos de la filosofía”

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Alejandro Llano: “Caminos de la filosofía”. Eunsa. Pamplona 2011. 404 pgs.

     Não é um livro fácil. Nem de divulgação. Mas segui os conselhos do professor Llano –a quem admiro pela sua clareza no pensar e no dizer- de que é preciso desafiar o aluno com assuntos que não seja capaz de entender logo de cara. “Uma das coisas mais formativas é o esforço por compreender colocações que, de cara, não se entendem. Se algum estudante me diz: ‘não vou a essa conferência porque não entenderei nada’, respondo que nunca poderão entender discursos minimamente sérios, porque a única maneira de superar o que já se entende é tentar desvelar o que aparentemente te supera”. Senti-me desafiado, enfrentei a parada, evitei a tentação de ler em diagonal bastantes trechos que me resultaram árduos.

     Apesar do meu empenho é forçoso dizer que senti falta da habitual clareza de Llano nos seus escritos. Talvez porque este livro foi idealizado por três dos seus discípulos, hoje professores de filosofia em diversas universidades espalhadas pelo mundo, e se converte numa conversa entre eles, o que para os vulgares mortais resulta difícil de acompanhar. Mesmo para quem já tem alguma familiaridade com a filosofia, e se aventurou a ler muitos autores, o diálogo não é claro. Aparece muito nome, muito filósofo que se cita com a familiaridade de quem já está de volta, de quem já entendeu as primeiras, segundas e últimas intenções –e consequências- desses autores. Não é um livro para promover a filosofia, mas uma conversa de filósofos, ou talvez, de professores de filosofia. Penso que estes diálogos subtraíram a clareza que é habitual no autor quando está dando aulas, ou simplesmente escrevendo o que ensina.

     Uma explicação que pode esclarecer. Em certo momento do livro, o autor diz que há filósofos de “segunda volta”, de segundo tempo. Refere-se aqueles que, antes do leitor confrontar-se com os seus escritos, se requer um aquecimento intelectual lendo outros filósofos. Não se pode enfrentar, por exemplo, Heidegger, ou Wittgenstein, em frio, logo de cara. “Todos os filósofos contemporâneos são de segundo tempo. E mesmo os anteriores, até os pré-socráticos que parece que estão falando sempre uns com os outros” .

     Este é, claramente, um livro de segunda volta. E a dificuldade na leitura entranha um recado claro: não se aprende filosofia, mas a filosofar; e somente se aprende a filosofar, estudando filosofia. A filosofia somente se alcança quando se assume uma atitude filosófica. Resulta imprescindível aprender com interlocutores e não apenas com material, acumulando créditos, e competências. Não se aprende filosofia andando pelo campo e olhando as estrelas, mas no diálogo com os filósofos. São imprescindíveis interlocutores com quem dialogar, livros, ambiente fértil. Em muitos dos ambientes universitários atuais, onde a utilidade e o benefício (as competências e os requisitos administrativos) passam por cima do diálogo e do ambiente fértil de pensamento, a ameaça para a filosofia é séria.
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Gravidade: Epopeia Feminina à Conquista do Espaço (interior)

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Gravity.(2013) Diretor: Alfonso Cuarón. Sandra Bullock. George Clooney, , 93 min.

     Um belíssimo filme. Com peso, densidade, com a gravidade que parece faltar no cenário espacial. Dito isto, e para aumentar os créditos, vale comentar a seguir o processo como fui seduzido. Os filmes de ficção nunca foram a minha praia. Se a ficção é espacial, e as críticas recomendam ver em 3D, sei que posso esperar uma constelação de efeitos especiais que tentam compensar a falta de conteúdo humano, que é a verdadeira isca com a que um filme consegue me fisgar. Resisti-me à aventura espacial de Clooney e Bullock, fui encontrando desculpas –afinal há muito filme na lista de espera para ser visto- até que, num momento desavisado, apertei o play. Impactante. Não soube dizer por quê, mas deixou marca.

     Como dizia Ortega, somos também nossas circunstâncias. As minhas guardavam, ainda quentes, as ponderações geradas pelos livros que tinha acabado de ler e comentar. Garotas no limite, de Leonard Sax, onde se fala das mulheres –adolescentes, para ser mais preciso- que estão conectadas com metade do planeta, e desconectadas delas mesmas, da sua intimidade. A biografia de Marañon, onde se adverte que o romantismo precisa de tempo e solidão para ser vivido, distanciando-se da pressa e da técnica. E um texto que o Papa Francisco enviou no dia mundial das comunicações aos detentores da mídia, sugerindo que se esforcem por encontrar no ambiente digital o sentido da pausa e da calma, o silêncio que permite escutar, dimensões todas que nos ajudam a crescer em humanidade e em compreensão recíproca
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Antonio López Vega: Gregorio Marañón. Radiografía de un Liberal

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Antonio López Vega: Gregorio Marañón. Radiografía de un Liberal. Taurus. Madrid 2011. 552 pgs.

     O livro esta escrito em espanhol, mas merece um comentário em português, por dois motivos. O primeiro é a amizade que me une ao autor –que me deu este exemplar onde estampou uma dedicatória apaixonada, sabendo do muito que eu me inspiro nos escritos e na vida do Dr. Marañón. Uma dívida com atraso, pois tenho o livro há mais de ano, e somente agora consegui serenidade para lê-lo com calma. O segundo motivo, que está intrinsicamente ligado ao primeiro, é promover a figura de Marañon –e do seu biógrafo, talvez a maior autoridade no tema, diretor da Fundação Ortega- Marañón em Madrid- entre o público brasileiro.

     Forçoso é reconhecer que há mais de vinte anos venho comentando –e traduzindo ao português- o pensamento de Gregorio Marañón, como recurso imprescindível na formação dos médicos, em particular, e do ser humano em geral. Em todos os meus livros, e em muitas das publicações, as citações de Marañón são frequentes; e também textuais, porque é difícil exprimir com menos ou melhores palavras os conceitos que o médico espanhol esculpia nos seus escritos. O desconhecimento da sua pessoa e obra é quase total no nosso meio acadêmico-cultural Brasileiro, e esta biografia, que parece ser definitiva, mereceria uma tradução e a consequente promoção no nosso pais. Vale anotar que das três viagens que Marañón realizou a América do Sul, o único pais que visitou em todas elas, foi o Brasil, e lhe produziu esse efeito encantador que seduz aos intelectuais que nos visitam. Lembrei das palavras de Paul Claudel, numa circunstância semelhante: “Qualquer um pode dizer o que bem entender do Brasil, mas não tem como negar que se trata de um desses países pungentes, que impregnam a alma e a deixam com um certo tom, um vezo, um tempero de que ela nunca mais conseguirá se ver livre”. Espero que estes comentário caiam na mão de algum editor que tenha a coragem de enfrentar esta empreitada. Posso lhe assegurar que não se arrependerá.

     A leitura desta biografia teve o sabor do tempero conhecido; isso sim, ordenado com arte e precisão, especialmente no relativo à profissão médica. “Essa visão antropocêntrica da medicina, onde tudo gira em volta do enfermo e da sua circunstância, é a que fez que Marañón passa-se à historia como o protótipo de medico humanista, precursor do que hoje se denomina medicina personalizada, que centra os diagnósticos e tratamentos nas peculiaridades biológicas, fisiológicos e metabólicas de cada paciente (…) Advogava por uma medicina que se ajustasse ao indivíduo, e não ao contrário. Era preciso colocar o foco da atenção médica no paciente ao invés de coloca-lo na doença”. (…) O Manual de diagnóstico etiológico, era a expressão da sua defesa de uma medicina integral: a evolução da medicina revela e acentua o paradoxo de que , conforme a especialização se torna mas necessária e eficaz, é também mais necessário que todo médico especialista tenha uma base de orientação sintética, geral, que alcance todos os galhos da nossa arte, mesmo os mais afastados de atividade habitual de cada um. (…) Em 1959, quando recebe o Doutorado Honoris Causa em Coimbra, insiste na necessidade de conciliar técnica com humanismo, pois “não são opostos, como muitos pensam, mas uma encruzilhada de forças distintas, inevitável e fecunda”. Este é o legado que ele queria deixa, como médico humanista: a imprescindível compreensão da medicina, de maneira individualizada e integral. São todos conceitos, ideias, fatos que fazem parte do meu quotidiano como médico e como professor de medicina. Relembrar estas realidades me fizeram pensar, com agradecimento, o muito que pessoalmente devo a Marañón.
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John Green: “A Culpa é das Estrelas”

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John Green: “A Culpa é das Estrelas”. Ed Intrínseca. Rio de Janeiro. 2012. 286 pgs.

     Recebi este livro num amigo secreto natalino, com uma recomendação muito precisa: manter-se afinado com o que os jovens de hoje pensam. Quer dizer: um recurso para conhecer os mistérios do jovem. Reconheço que no início tive certa repulsa; lembrei do Nelson Rodrigues que explodia aqueles que tudo creditavam aos jovens, pelo simples fato de sê-lo, sem atentar para nenhum outro valor ou conteúdo que, por ventura, se pudesse encontrar no sujeito. Mas, mesmo assim, enfrentei o desafio.

     Encontrei pontos positivos, bastantes. A originalidade, o primeiro: uma narração, em primeira pessoa, de uma garota adolescente com câncer, lutando pela sobrevivência. O humor, desenfadado, espirituoso, que permeia as situações, ou melhor, os diálogos que são a grande base do romance. E, um destaque especial, para a tradução. Não li o original em inglês, mas a adaptação de linguagem é perfeita, tem a similitude da curiosa melodia com que os jovens se exprimem. Frases como “minha mãe permaneceu abraçada a mim, tipo, um bilhão de anos”, “foi mal, desculpa”, resultam familiares.
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Eva Illouz: “Por qué duele el amor”

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Eva Illouz: “Por qué duele el amor” Ed Katz. Buenos Aires.2012 363 pgs.

     Uma crítica literária chamou minha atenção sobre este livro. Depois, foi um artigo –parece-me recordar que sobre a educação dos garotos que se transformam em homens que ignoram o compromisso- onde também se falava desta obra. Comprei-a e aguardei o momento apropriado para lê-la. O momento chegou há três dias. Uma explicação sociológica sobre porque o amor –a falta do mesmo- dói. Após ler 40 páginas, não consegui encontrar a proposta da autora. Meia dúzia de frases soltas davam alguma pista: “analisar o que falha nas relações contemporâneas, delinear as causas institucionais do sofrimento amoroso, manejo dos sentimentos, as emoções que formam a história, etc. etc. Mas, o que estará querendo, perguntei-me? Ainda no capítulo introdutório tropecei com uma passagem que me deixou a pulga atrás da orelha: “meu objetivo é fazer com o amor o mesmo que Marx fez com a mercadoria: demostrar que são as relações sociais as que o produzem e configuram, num mercado onde os atores competem desigualmente, sendo que umas tem mais capacidade do que outras para definir em que termos serão amadas”. Não deu outra. A dialética do amor, na perspectiva da autora, é tão complicada que não consegui entender absolutamente nada. Até duvido que ela mesma entenda, porque o livro –que li em diagonal, várias vezes, pulando páginas- não é um livro, mas uma colcha de retalhos, um ajuntamento de péssimo gosto, e pior qualidade. Parece um desses TCC feito às presas, copiando e colando comentários da Wikipedia. Lá aparecem Jane Austen, Flaubert, Descartes, Warthon, Dostoievski, Kierkeergard, numa salada cósmica temperada com blogs e entrevistas de mulheres mal amadas, e de homens garanhões. Uma solene perda de tempo. Melhor seria investir o tempo em ler alguns dos clássicos citados, que devem ter se revolvido no túmulo. Por que dói o amor? A resposta não está neste livro. Empregue seus anseios de cultura em escutar o quarteto de Rigoletto, onde Gilda se mostra apaixonada pelo sedutor que parte para outra conquista; ou aprecie o diálogo de amor de Butterfly com Pinkerton, e aprenda como se pode enganar alguém cantando coisas maravilhosas. Ou, se gosta de algo mais escabroso, saboreie a lista de conquistas de D. Giovanni, cantadas por Leporello: “Madamina, Il catálogo e questo”. Certamente aproveitará mais para entender das dores do amor. Deste livro, o único que se salva é o título. Um belo golpe de marketing. Já se vê que os marqueteiros fazem milagres e, se não estamos atentos, nos roubam o tempo, e o decoro.

Leonard Sax: “Garotas no Limite”

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Leonard Sax: “Garotas no Limite”. (Girls on the edge). Basic Books. New York. 2011. 258 pgs.

     Cumpri uma pendência que deixei anotada no comentário que fiz, um ano atrás, do livro de Leonard Sax, Boys Adrift, sobre a formação dos meninos. Aproveitando uma viagem neste ano, comprei o terceiro livro do autor, agora sobre a educação das meninas. Fascinante, como os anteriores, e preocupante. O autor expõe com tremenda clareza o que, na sua opinião, são os fatores que ameaçam a correta formação das garotas nestes tempos que vivemos. Suas afirmações tem um duplo embasamento: a sua experiência clínica (20 anos atendendo adolescentes como médico) e a extensa bibliografia, amplamente detalhada no final da obra. Pode se concordar ou não com as suas teses, mas ninguém poderá dizer que a pesquisa carece de profundidade e de apoio científico. Em qualquer caso, é um material riquíssimo para reflexão dos pais, pois é para eles que Sax escreve: ser pai não é uma ciência, mas um arte que deve aprender-se a praticar. Nem sempre se oferecem soluções que resolvam os desafios atuais. Traz elementos que fazem pensar, e que sugerem soluções que cada um deverá costurar por sua conta.

     A grande empreitada –o núcleo do livro- é sobre como ajudar às meninas a construir sua identidade como mulheres. E para tamanha tarefa, Sax convoca no fórum de discussão pesquisas recentes (a maioria procedentes de USA), pensadores e educadores, e tempera o cenário com histórias de vida das suas próprias pacientes. Uma cita de Rilke abre o espetáculo: “Entra dentro de ti e descobre quão profundo é o lugar de onde floresce a tua vida”. A identidade é saber quem você é, e não a aparência que você tem. Identidade não tem a ver com o teu aspecto, com o dinheiro que teus pais têm, quantas músicas guardas no iPod, ou amigos se amontoam no teu Facebook. Identidade é conexão com você mesma.
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Nelson Rodrigues: “O Óbvio Ululante”

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Nelson Rodrigues: “O Óbvio Ululante”. Companhia das Letras. São Paulo. 1993. 300 pgs.

     Quem, como eu, inclui-se no grupo dos que se atrevem a escrever como amadores, fará bem se, com regularidade, frequenta aqueles que fizeram da escrita seu modus vivendi. É um aprendizado continuo: tornar claras nossas ideias, comunicar-nos, e entender o que nós mesmos pensamos. Ler e reler, como já adverte o autor que nos ocupa: “Por tudo que sei da vida, dos homens, deve-se ler pouco e reler muito. A arte da leitura é a da releitura. Há uns poucos livros totais, uns três ou quatro, que nos salvam ou que nos perdem. É preciso relê-los, sempre e sempre, com obtusa pertinácia”.

     Nelson Rodrigues, um dos grandes do teatro brasileiro, oferece uma prosa leve, bem construída; um idioma vivo que guarda, ao mesmo tempo, o sabor de rua e uma rara distinção, quase aristocrática, de quem observa e disseca a alma humana, seus costumes, suas virtudes e misérias. Vê, compreende, sorri, e nos faz pensar. Passados mais de 50 anos, suas agudas observações permanecem atuais. Os temas hoje em pauta são outros –Nelson reflete sobre as passeatas, a esquerda festiva, o Vietnã, Sartre e outras personagens que estavam no candeeiro, – mas a condição humana é a mesma. Basta fazer um transporte de tonalidade, como dizem os músicos, e o novo registro nos brindará um curioso aproveitamento destas confissões.

     O Óbvio Ululante é um livro para ser degustado. Na verdade não é um livro, mas uma coletânea das confissões publicadas em O Globo, no ano de 1968. Por isso aproveita mais quando se lê com conta gotas, deixando pingar a cada dia uma ou duas crônicas, pois esse foi o propósito do autor. Até por que, logo no início, reconhece que se repete nos argumentos; algo que num livro formal seria bizarro, mas perfeitamente desculpável –até necessário- nas crónicas diárias, que recolhem o pulsar da sociedade. “A minha imaginação é rala e, repito, a minha imaginação é escassa. Mas sou profissional e tenho que subvencionar o leite do caçula e o sapato da mulher. E que faço? O meu processo é repetir. Arranquei de mim mesmo, a dura penas, uma meia dúzia de imagens. E um dia sim, outro não, repito a metáfora da antevéspera. A televisão vive das reprises dos seus filmes, eu vivo das reprises das minhas imagens”. Quando me deparei com esta afirmação lembrei do comentário de um amigo: na vida é preciso ter três ou quatro boas ideias, e repeti-las sempre, de modo diferente.
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